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domingo, 16 de junho de 2013

Admirável Mundo novo


A primeira vez que li este livro, o fiz motivado pela indicação de um professor de História da Educação, enquanto cursava Pedagogia na UNESA. Ver que o mesmo era fonte de uma série de estudos filosóficos sobre o filme Matrix reforçou ainda mais. Anos mais tarde começo a vislumbrar uma realidade cada vez mais parecida com os horrores descritos no livro em apreço. É mais do que fato que em nossa sociedade ainda não vivemos a realidade da clonagem, muito menos da programação genética, o que deixa um espaço, ainda que mínimo para a liberdade, visto que ao contrário do que verificamos no romance, as pessoas ainda podem (em tese), escolher que função exercer em nossa sociedade. Outra realidade da qual estamos distantes é a forma de envelhecimento. As pessoas da distopia huxelyana não sofrem os efeitos da ação do tempo, elas não envelhecem, apenas morrem, e mais uma vez vemos aqui a alteração genética. De acordo com Pondé, aqui vivemos um tipo de bovarismo, onde as pessoas com maiores recursos, apelam às cirurgias plásticas como forma de uma suposta correção dos efeitos da ação do tempo. Mas alguns pontos relatados no romance podem ser vistos em nosso nada admirável mundo. 
O primeiro, as pessoas são programadas, mediante constante emprego da psicologia behaviorista, a cada vez pensarem menos, ou serem menos críticas. Com isto não queremos dizer que a sociedade não era eficiente, muito pelo contrário, com as pessoas geneticamente programadas para exercerem as suas respectivas funções, com a divisão humane em Alfa, Beta, e outras categorias sendo cada uma destinada a um conjunto de funções sociais, tudo corria bem, do ponto de vista tecnocrático. Mas sem nenhuma liberdade para o pensamento, ou para a crítica. Cabe lembrar que mesmo que tal não tenha ocorrido, se de alguma forma vier a ocorrer teremos um fenômeno descrito por Lewis no seu A Abolição do homem. Em outras palavras, no dia em que a ciência de alguns homens que dominam a natureza alcançar o homem, e controlá-lo da mesmo forma que o faz com os demais fenômenos naturais então será o fim. 
E de fato, não é preciso ser cientista para perceber o alto investimento em marketing que os que controlam as mídias fazem, para que percebamos como o estímulo está associado à resposta. Basta olhar para o comercial do guaraná, da cerveja e perceber a associação que se faz entre bebida e sexo, diversão, entretenimento, satisfação e coisas do tipo. Mas o behaviorismo não se limita ênfase no consumo, mas afeta igualmente a ação política, que em nossa sociedade não é mais decidida por meio do pensamento crítico, mas pelo apelo midiático constante, a propaganda, ou o que chamam de debate, que na verdade é o uso de estratagemas artificiosos para o convencimento. 
O segundo aspecto em que ocorrem semelhanças entre a sociedade descrita no livro, e a nossa, é o alto investimento que a mesma fazia nos prazeres do sentido. Aqui fica o alerta para as atuais iniciativas governamentais para com a Educação sexual, por exemplo. A imagem de nosso país, é vendida por aí afora como a de um paraíso sexual. O mais curioso é que os colonizadores da América virão nela um protótipo do paraíso perdido em função da liberdade religiosa que lá experimentaram. Os Colonizadores daqui viram um paraíso em termos de riquezas a serem exploradas. Hoje, além da exploração das riquezas, da mão de obra barata, temos a exploração sexual, amplamente fortalecida e apimentada pelos debates em torno da legitimidade das relações homo afetivas, e da legalização da prostituição como profissão. Enfim, o tema da sexualidade anda em voga, mas o que está por trás de todo este discurso de liberdade é o uso do sexo como arma para amortecer o ímpeto das pessoas, mas como o texto mesmo o diz, esta é uma prisão da qual ninguém quer sair. 
Isto é bem parecido com o que Platão elaborou em sua República. A despeito de todo aquele papo que lemos no livro sétimo, a grande verdade é que a república de Platão era baseada numa mentira, que para ser sustentada, mantida, os soldados, e os demais membros da sociedade eram premiados com muita diversão e muito prazer para os seus sentidos, de forma que não viessem a questionar o sábio rei filósofo. Para isto, as mulheres seriam comunais, os guerreiros teriam direito a quantas mulheres e a quantos meninos quisessem, e estariam sempre prontos a exercerem a função para a qual nasceram programados a de defender a cidade. No entendimento platônico as almas humanas não eram iguais, alguns tinham alma de ferro (os soldados), outros de bronze (os artesãos), e os rei filósofo, uma alma de ouro. Deu para ver a semelhança? 
Por último, o mais curioso, dois grandes legados de nossa cultura, a ciência, a religião e as artes, entrarão cada vez mais em declínio até que estejam em museus acessíveis somente aos governantes e aos poderosos. Tal como na República de Platão, onde somente o sábio filósofo saia da caverna a fim de contemplar as idéias puras, assim ocorre em nossa sociedade, onde o conhecimento e a ciência estão empregando uma linguagem cada vez mais hermética, acessível somente aos iniciados nos saberes, que nunca são democratizados. As artes estão sofrendo contínuo declínio, de forma que as melhores elaboradas são cada vez mais inacessíveis ao povo leigo, e tudo reforçado por um discurso antropológico relativista. a própria religião tende a se transformar em um caldeirão de sopa de entulho. Em nome de um discurso em prol da diversidade estão construindo justamente o contrário, uma religiosidade na qual todos os deuses são igualmente verdadeiros. É mais do que lógico, que do momento em que as pessoas afirma que duas coisas opostas são verdadeiras, nenhuma delas na verdade o é. 
Esta mistura de psicologia comportamentalista, com uma política de incentivo aos prazeres, aliada à morte da ciência, da arte, e da religião produzem o cenário descrito por Huxley, onde o mundo é uma ditadura disfarçada de democracia, e a sociedade uma prisão sem muros, da qual as pessoas não querem sair, por estarem drogadas pelo prazer. 

Marcelo Medeiros

4 comentários:

  1. Li este livro faz muito tempo. Um outro detalhe importante, do qual me recordo, mencionado no livro de Huxley, é o condicionamento a que são submetidas as crianças, ainda na mais tenra idade. Um grupo delas ao se aproximarem dos livros recebem descargas de choque elétrico e passam a evitá-los.
    Como esperar que nossos cidadãos desenvolvam pensamento crítico se lhe são negados o acesso à informação? Estas lhes chegam através de novelas, que distorcem o comportamento e de noticiosos tendenciosos e comprometidos com os detentores do poder.

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    Respostas
    1. Em nosso país, este condicionamento é feito de outra forma. As pessoas são simplesmente desestimuladas de estudar, ler e desenvolver o pensamento crítico, por meio de uma espécie de de bullying contra a intelectualidade, o que não deixa de ser um condicionamento.

      Grato pelo belíssimo comentário.

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    2. Hipocrisia, desonestidade, alienação, fata de espelho em casa, ou tudo isso junto?

      http://www.youtube.com/watch?v=I4-soVb4TuU

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    3. Anônimo, cujo nome e ignorância conheço de outras redes sociais, o que o teu comentário tem a ver com a fala do Huxley, ou com o livro citado por mim e pelo Luís Carlos Fe? Em que aspecto as palavras que vc cita e claramente demonstra desconhecer tem a ver com o conteúdo da postagem?

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