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sábado, 22 de julho de 2017

O SENHOR E SALVADOR JESUS CRISTO


Estudar a respeito da pessoa e Jesus Cristo é de suma importância. Os cristãos precisam ter em mente a resposta para a pergunta que Cristo fez aos seus discípulos: e vós quem dizeis que eu sou? Jonh Stott destaca a tendência ao longo da História da Igreja em criar personagens caricatas da pessoa de Jesus, sendo que a salvação é dada unicamente aos que creem em Cristo como dizem as Escrituras. 

por este motivo acredito que o estudo a respeito da pessoa de Cristo, precisa de ser precedido pelo estudo a respeito da autoridade da Bíblia. Somente a partir da inerrância das Sagradas Escrituras, posso acreditar que os Evangelhos façam um retrato fidedigno de Cristo. Não é difícil ver em Jesus a figura de um filósofo, de um poeta, de um comunista, conforme pode ser visto aqui

Por mais bela, inteligente, útil e sedutora que possa ser a construção do Jesus histórico da Teologia Latino Americana, por exemplo, e por mais que coadune em alguns aspectos, percebo que não posso perder de vista as afirmações de Lewis a respeito do Jesus histórico, para quem tais procedem mais da necessidade de adaptar Cristianismo como politica. Através do personagem Fitafuso, ele afirma: 
Você perceberá que muitos escritores e políticos cristãos pensam que o Cristianismo começou a dar errado bem cedo, afastando-se da doutrina do seu Fundador. Devemos fazer uso dessa ideia para encorajar mais uma vez o conceito de um "Jesus histórico", que só será encontrado se eles se livrarem dos "acúmulos e perversões", posteriores, para depois compará-los com a tradição cristã. Na última geração de seres humanos, nós conseguimos estimular uma interpretação do tal "Jesus Histórico" em linhas mais liberais e humanitárias; agora formulamos um novo Jesus histórico, em linhas Marxistas, catastróficas e revolucionárias. As vantagens dessas interpretações, que esperamos modificar a cada trinta anos mais ou menos, são inúmeras. Em primeiro lugar, elas tendem a direcionar a devoção dos homens para algo que não existe, pois cada "Jesus Histórico" não existe na história. Os documentos dizem o que dizem, e não podem ser alterados; cada novo "Jesus Histórico", portanto tem de ser criado a partir destes documentos, suprimindo certos aspectos e exagerando outros, e também fazendo certas suposições [...]
Em segundo lugar cada uma dessas interpretações confia a importância do seu "Jesus Histórico" a alguma estranha teoria que se supõe que ele tenha pregado. Ele tem de ser um grande homem, no sentido moderno da expressão - um homem no fim de uma linha centrífuga e desequilibrada - um excêntrico que vende uma panaceia. Desse modo conseguimos distrair a mente dos homens daquilo que Ele É e daquilo que Ele Fez. [...] fazemos dele um simples mestre, e depois escondemos a própria semelhança essencial que existe entre seus ensinamentos e aqueles de todos outros grandes mestres de moral (LEWIS, p. 115, 116, 2007). 
Lewis começa criticando o reducionismo da maioria das vidas de Jesus, ou buscas pelo Jesus histórico, visto que o quadro pintado por aqueles que seriam as testemunhas oculares da vida de Cristo pintam um quadro bem diversificado. Esta diversidade de olhares a respeito da pessoa de Cristo aponta para o problema de sua extrema complexidade. Jesus é plenamente Deus (Jo 1. 1, 2; 20. 28; Rm 9. 5; Tt 2. 13), homem perfeito (Gl 4. 4, 5; I Tm 2. 5), pastor (I Pe 2. 25), mestre (Jo 3. 2), apóstolo (Hb 3. 1), rei (I Tm 6. 16), juiz (Jo 5. 22), sacerdote (Hb 4. 14 - 16). 

A fonte para toda e qualquer busca a respeito da pessoa e obra de Cristo tem de ser a Escritura, com sua diversidade de olhares a respeito da pessoa e obra de Cristo, desde o Filho de Abraão e de Davi, até o REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES do livro do Apocalipse. A visão de Cristo como mero mestre de moral (tendência das percepções reducionistas), impede a percepção de que como tal Jesus seria mais um . dentre tantos outros que vieram. 

O presente estudo reflete, em termos, o terceiro artigo do cremos das Assembleias de Deus. Que assevera: cremos, 
No Senhor Jesus Cristo, o Filho Unigênito de Deus, plenamente Deus, plenamente Homem, na concepção e no seu nascimento virginal, em sua morte vicária e expiatória, em sua ressurreição corporal dentre os mortos e em sua ascensão vitoriosa aos céus como Salvador do mundo (Jo 3.16-18; Rm 1.3,4; Is 7.14; Mt 1.23; Hb 10.12; Rm 8.34 e At 1.9). 
Este destaca: 1) o Senhorio de Cristo; 2) sua procedência do Pai; 3) sua divindade; 4) sua humanidade; 5) nascimento virginal; 6) morte expiatória e vicária; 7) ressurreição e ascensão, bem como sua posição como salvador, sendo intimamente ligadas uma à outra. Na perspectiva de Jonh Stott, tanto o senhorio quanto a divindade de Cristo estão intimamente ligados. Para este,
quando o Antigo Testamento veio a ser traduzido para o grego em Alexandria, cerca de 200 a. C., os devotos e estudiosos judeus não sabiam como lidar com o nome sagrado de Javé, ou Jeová. Eles eram reticentes demais em pronunciá-lo; não sentiam a liberdade para traduzi-lo, ou mesmo para transliterá-lo. portanto eles colocavam em seu lugar a paráfrase ho Kyrios, ("o Senhor"), razão pela qual Javé ainda aparece na maioria das versões como "Senhor" [....]
O que realmente é impressionante é que os seguidores de Jesus, sabendo que, pelo menos em círculos judaicos, ho Kyrios, era o título tradicionalmente dado a Javé, criador do Universo, e o Deus da aliança de Israel, não tinham escrúpulo de aplicar o mesmo nome a Jesus, nem viam nenhum mal em fazê-lo (OUÇA O ESPÍRITO, OUÇA O MUNDO, P. 98). 
Na perspectiva do autor era uma confissão de admissão da divindade de Cristo. Mais do que isto: falas tipicamente atribuídas a Iahweh são aplicadas à pessoa de Cristo no Novo Testamento. Então todo aquele que invocar o nome de Iahweh, será salvo. porque no monte de Sião e em Jerusalém haverá ilesos - como Iahweh falou - entre os sobreviventes que Iahweh chama (Jl 3. 5 Bíblia de Jerusalém [2. 32]). 

Este mesmo texto recebe um tratamento bem fundamentado de Stott. Minha pretensão é a de que apenas a confissão de Fé da Igreja primitiva sejam suficientes. Nesta o Senhorio de Cristo e sua obra de salvação se encontram explicitamente.
A saber: Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Visto que com o coração se crê para a justiça, e com a boca se faz confissão para a salvação. Porque a Escritura diz: Todo aquele que nele crer não será confundido. Porquanto não há diferença entre judeu e grego; porque um mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam. Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo (Rm 10. 9 - 13). 
A confissão de Cristo aliada à crença na ressurreição dentre os mortos á condição para a salvação. Note que aqui Jesus é chamado de κυριον (Kyrion). Perceba que não se trata de mera aceitação do pecador a Jesus. Não é a admissão de seu senhorio que traz a condição para a salvação. Daí apos citar Isaías Paulo cita Joel associando Jesus à Iahweh.

Na perspectiva joanina, ele é o ο λογος (hó logos) criador, que participa da criação, com o Pai e com o Espírito. 
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam (Jo 1. 1 -  5). 
Neste último texto a figura de Jesus é associada ao λογος, que por sua vez é a associada à sabedoria no judaísmo helênico, conforme destaca Esequias Soares em seu livro Cristologia lançado pela Hagnos. Em primeiro lugar, é afirmado aqui que λογος estava com Deus. E em outros momentos Jesus fala de uma glória que tinha junto ao Pai antes da fundação do mundo. 
E agora glorifica-me tu, ó Pai, junto de ti mesmo, com aquela glória que tinha contigo antes que o mundo existisse. Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo (Jo 17. 5, 24 ACF). 
Ele estava com Deus no princípio (Jo 1. 2 NVI).  Em segundo lugar λογος é Deus. Jesus é Deus pois tem o poder de fazer as mesmas coisas que o Pai, dentre as quais exercer o juízo, salvar e dar vida aos mortos, conforme de pode perceber neste texto. 
Mas Jesus respondeu, e disse-lhes: Na verdade, na verdade vos digo que o Filho por si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer o Pai; porque tudo quanto ele faz, o Filho o faz igualmente. Porque o Pai ama o Filho, e mostra-lhe tudo o que faz; e ele lhe mostrará maiores obras do que estas, para que vos maravilheis. Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer. E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo; Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou. Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida. Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora, e agora é, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão. Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo; E deu-lhe o poder de exercer o juízo, porque é o Filho do homem. Não vos maravilheis disto; porque vem a hora em que todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz. E os que fizeram o bem sairão para a ressurreição da vida; e os que fizeram o mal para a ressurreição da condenação. Eu não posso de mim mesmo fazer coisa alguma. Como ouço, assim julgo; e o meu juízo é justo, porque não busco a minha vontade, mas a vontade do Pai que me enviou (Jo 5. 19 - 30 ACF). 
Não bastassem tais elementos, à semelhança de Paulo, João afirma que Jesus é digno de semelhante honra que o PAI tem. Ainda que arianos e subordinacionistas amem textos como este, a verdade é que o judeu entendia perfeitamente bem que ao se afirmar FILHO DE DEUS, JESUS SE EQUIPARAVA AO PAI.

Em terceiro lugar à semelhança do PAI, λογος é fonte de vida. Pois, assim como o Pai ressuscita os mortos, e os vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer. E: como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo

JESUS É SENHOR E SALVADOR.  

quinta-feira, 20 de julho de 2017

A Santíssima Trindade: Um Só Deus em Três pessoas


O Estudo a respeito da doutrina da Trindade é um desdobramento do segundo artigo do cremos das Assembleias de Deus. Na lição de número dois há a abordagem a respeito do monoteísmo. O segundo artigo do cremos afirma que há um só Deus, que por sua vez subsiste em três pessoas: a do Pai, a do Filho, e a do Espírito Santo.

Não é um ensino que se possa embasar facilmente em textos isolados do Antigo Testamento. De forma alguma! É comum a recorrência aos textos que falam da criação, da torre de Babel, e outros do tipo, para fundamentar a doutrina da Trindade no Antigo Testamento. Mas há um problema com relação a este tipo de exegese: a resposta judaica. O texto bíblico versa:
E disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine sobre os peixes do mar, e sobre as aves dos céus, e sobre o gado, e sobre toda a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra. E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou (Gn 1. 26, 27 ACF).
Antes de apresentar a resposta judaica, preciso pontuar, explicar que sou cristão trinitariano. Acredito em trindade. Somente Deus poderia suportar o que Cristo suportou, e somente como Deus/Homem, Cristo pode socorrer perfeitamente todo aquele que o invoca. Somente Deus pode suportar a rebeldia nossa de cada dia, nossas resistências diárias e o Espírito o faz.

Mas o maior problema com relação à toda forma de rejeição da Doutrina da Trindade é que sendo Deus Espírito infinito a pessoalidade é o único ponto de contato possível entre este e o homem, conforme asseverado por Shaeffer em sua trilogia: O Deus que se revela, O Deus que intervém, A Morte da Razão. Mas como um Deus que é um só pode ser pessoal? Claro que aqui cabe o questionamento a respeito da aplicabilidade do termo a Deus. Mas fato é que mesmo a Hagadá de Gênesis 2 evoca um relacionamento de amor entre Deus e Israel, e entre aquele e a criação.

Logo, em consonância com o pensamento de Louis Berkhof, antes da criação do tempo Deus expressou sua personalidade em relacionamento de amor com seu Filho e de ambos com o Espirito Santo. Explicarei melhor este pensamento quanto postar aqui as citações de um livre pensador, que na minha opinião foi quem melhor soube expressar este pensamento: C. S. Lewis.

Meu propósito foi tão somente explicar que a despeito de ser cristão trinitariano não vejo o texto de Gn 1. 26, por exemplo como base para fundamentação do pensamento a respeito de Trindade, até porque a revelação a respeito de Deus é progressiva. Alguns exemplos: o nome de Deus, O Eterno não foi revelado aos patriarcas, foi a Moisés; não há espaço para uma angelologia elaborada em Gênesis (são seres espirituais? como comem, podem ser vistos pelos homens e desejados?); Abraão vê Deus, por que os demais não o podem? São questões que se respondidas conduzem ao caráter progressivo da teologia bíblica. Retornando ao pensamento da Hagadá.

A respeito de Gn 1. 26, eles afirmam:
É necessário explicar muito bem este versículo, porque a sua formação esconde muitas surpresas. Os idólatras defendem a existência de uma divindade múltipla e usam este texto como prova, porque nele se lê no plural: Façamos o homem [...]
No início da criação o Senhor deu vida a três artesãos: o céu, a terra, e a água. Confiou a cada qual uma tarefa e lhes deu a capacidade de lavá-la a bom termo. Deu ordens à água para que se juntasse e fizesse a parte enxuta, à terra para que desse origem aos corpos celestes que a iluminariam, e ao céu para que formasse o firmamento e separasse as suas águas. À água ordenou ainda que desse origem aos peixes e às outras criaturas. Desse modo, foram criadas todas as coisas, cada uma no seu dia mais apropriado, graças á esses três artesãos. No sexto dia todos se reuniram para ouvir o que o Senhor tinha para lhes dizer. 
Mas o Santo, Bendito seja, disse: "no dia de hoje quero criar a criatura mais importante do Universo, a qual chamarei Adão, homem. Nenhum de vós poderá realizar esta obra sozinho, muito embora tenhais contribuído para realizar o restante. Portanto deveis atuar juntos, e eu me unirei a vós. Vós havereis de prover os elementos para o corpo do homem, enquanto eu lhes darei uma alma santa e um espírito imortal". (Homem e mulher a Imagem de Deus - Hagadá de Gn 2).  
Desta perspectiva o termo façamos é uma junção poética por meio da qual o mesmo Deus que dera ordem à terra para que produzisse a relva e toda sorte de animais, e às águas para que produzissem répteis, aves e monstros marinhos, agora convoca a terra, o vento, as águas e tudo o mais para a composição do homem.

Uma outra perspectiva que aparece no próprio Hagadá é a de que a expressão Façamos seja na verdade aquilo que se chama plural de majestade.
Uma última razão é que o rei e as personalidades importantes muitas vezes empregam a primeira pessoa do plural para exprimir a própria majestade. Deus, por isso disse: Façamos o homem, para expressar a sua grandeza e onipotência. (Homem e mulher a Imagem de Deus - Hagadá de Gn 2).  
A mesma regra pode ser aplicada aos textos que falam da expulsão do Paraíso, da confusão das línguas na Torre de Babel (Gn 3. 22; 11. 6). Estas afirmativas não querem dizer que a trindade passa a existir do momento em que os pais cristãos passam a falar em Trindade. É o mesmo que afirmar que a lei da gravidade foi criada por Newton, pior passou a existir a partir do momento em que foi elaborada.

Um caso bem curioso que precisa ser pensado é o do famoso ANJO DO SENHOR, ou מַלְאַ֣ךְ יְהוָ֔ה, mala'k YHWH. Este fala como sendo o próprio Deus, mas na verdade é um mediador entre Deus e os homens. É assim nos casos de Hagar (Gn 16. 1 - 9); Abraão (Gn 22. 1 - 15ss); Moisés (Ex 3. 1 - 15), neste último texto percebe-se inclusive que o מַלְאַ֣ךְ יְהוָ֔ה arroga para si o nome do próprio Deus. Em Juízes se percebe que ele arroga para si ações que são exclusivas do próprio Iahweh.
E subiu o anjo do SENHOR de Gilgal a Boquim, e disse: Do Egito vos fiz subir, e vos trouxe à terra que a vossos pais tinha jurado e disse: Nunca invalidarei a minha aliança convosco. E, quanto a vós, não fareis acordo com os moradores desta terra, antes derrubareis os seus altares; mas vós não obedecestes à minha voz. Por que fizestes isso? Assim também eu disse: Não os expulsarei de diante de vós; antes estarão como espinhos nas vossas ilhargas, e os seus deuses vos serão por laço. E sucedeu que, falando o anjo do Senhor estas palavras a todos os filhos de Israel, o povo levantou a sua voz e chorou (Jz 2. 1 - 4 ACF). 
Aqui o מַלְאַ֣ךְ יְהוָ֔ה arroga para si a saída do Egito. Algo similar ao caso da sarça ardente, onde se diz que o מַלְאַ֣ךְ יְהוָ֔ה aparece para Moisés, mas depois se diz que Deus viu que ele se virou para ver o fenômeno, e que Deus fala. Juntando todas estes textos percebe-se aqui a mediação entre seres celestiais e o próprio Deus. Mas há uma diferença. 


Não se pode confundir a mediação dos anjos na apocalíptica judaica e em textos nos quais estes são portadores de algum tipo de revelação com a manifestação do anjo do Senhor (מַלְאַ֣ךְ יְהוָ֔ה). Aqueles não recebem adoração e nem o terror e o espanto comum por parte dos visionários. E eu lancei-me a seus pés para o adorar; mas ele disse-me: Olha não faças tal; sou teu conservo, e de teus irmãos, que têm o testemunho de Jesus. Adora a Deus; porque o testemunho de Jesus é o espírito de profecia (Ap 19. 10 ACF). 



Se anjos são espíritos ministradores que trabalhem em prol dos que hão de herdar a salvação (Hb 1. 14), se são conservos dos que guardam o testemunho de Cristo (Ap 19. 10), se são criaturas, ao invés de seres autônomos, como explicar que dentre os anjos que visitam a Abraão um deles aceite adoração. 



No livro Falsos Deuses Timothy Keller chama a atenção do leitor para um fator pouco observado. Na narrativa da luta de Jacó com um varão. Na medida em que a alva sob, ou que o dia nasce, o varão pede para que Jacó o libere. Keller afirma que a razão de tal é para que o patriarca não veja o rosto de Deus. O que fica claro no final do texto, que diz:  E chamou Jacó o nome daquele lugar Peniel, porque dizia: Tenho visto a Deus face a face, e a minha alma foi salva (Gn 32. 20 ACF). 



O profeta Oséias fará uma significativa exegese deste texto ao dizer: 

O Senhor também com Judá tem contenda, e castigará Jacó segundo os seus caminhos; segundo as suas obras o recompensará. No ventre pegou do calcanhar de seu irmão, e na sua força lutou com Deus. Lutou com o anjo, e prevaleceu; chorou, e lhe suplicou; em Betel o achou, e ali falou conosco, Sim, o Senhor, o Deus dos Exércitos; o Senhor é o seu memorial (Os 12. 2 - 5 ACF). 
O profeta compara a contenda judicial com Israel (neste caso o Reino Norte), com a contenda que Jacó teve com o próprio Deus. Uma contenda que se inicia no ato do nascimento, na clara luta pela primogenitura, que se reflete na rivalidade com o irmão mais velho. É importante ter isto em mente, uma vez que a luta de Jacó com Deus no vau de Jaboc antecede a reconciliação deste com Esaú.

Tanto que quando se encontram Jacó afirma: se agora tenho achado graça em teus olhos, peço-te que tomes o meu presente da minha mão; porquanto tenho visto o teu rosto, como se tivesse visto o rosto de Deus, e tomaste contentamento em mim (Gn 33. 10 ACF). O encontro entre Deus e Jacó produziu reconciliação entre ele e seu irmão. Na verdade as trevas protegeram Jacó de ver Deus face à face.

Feita a exegese e interpretação mais básica do texto, convém apontar que para os interesses deste estudo basta a alternância entre as expressões Anjo (mala´k -  מַלְאַ֣ךְ), e Iahweh (יְהוָ֔ה). Primeiro se afirma que ele lutou com Deus, depois que lutou com o anjo e finalmente com o Deus dos exércitos. O pensamento de Keller reflete a ideia de que ninguém pode ver a Deus. 
Não poderás ver a minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face, e viverá. Disse mais o Senhor: Eis aqui um lugar junto a mim; aqui te porás sobre a penha. E acontecerá que, quando a minha glória passar, pôr-te-ei numa fenda da penha, e te cobrirei com a minha mão, até que eu haja passado. E, havendo eu tirado a minha mão, me verás pelas costas; mas a minha face não se verá (Ex 33. 20 - 23 ACF). 
Por esta razão Gideão teme ao ver o Anjo do Senhor.
Porém o anjo de Deus lhe disse: Toma a carne e os pães ázimos, e põe-nos sobre esta penha e derrama-lhe o caldo. E assim fez. E o anjo do Senhor estendeu a ponta do cajado, que estava na sua mão, e tocou a carne e os pães ázimos; então subiu o fogo da penha, e consumiu a carne e os pães ázimos; e o anjo do Senhor desapareceu de seus olhos. Então viu Gideão que era o anjo do SENHOR e disse: Ah, Senhor DEUS, pois vi o anjo do SENHOR face a face. Porém o Senhor lhe disse: Paz seja contigo; não temas; não morrerás (Jz 6. 20 - 23 ACF).
O mesmo dá-se com Manoá
Então Manoá disse ao anjo do Senhor: Ora deixa que te detenhamos, e te preparemos um cabrito. Porém o anjo do Senhor disse a Manoá: Ainda que me detenhas, não comerei de teu pão; e se fizeres holocausto o oferecerás ao Senhor. Porque não sabia Manoá que era o anjo do Senhor. E disse Manoá ao anjo do Senhor: Qual é o teu nome, para que, quando se cumprir a tua palavra, te honremos? E o anjo do Senhor lhe disse: Por que perguntas assim pelo meu nome, visto que é maravilhoso? Então Manoá tomou um cabrito e uma oferta de alimentos, e os ofereceu sobre uma penha ao Senhor: e houve-se o anjo maravilhosamente, observando-o Manoá e sua mulher. E sucedeu que, subindo a chama do altar para o céu, o anjo do Senhor subiu na chama do altar; o que vendo Manoá e sua mulher, caíram em terra sobre seus rostos. E nunca mais apareceu o anjo do Senhor a Manoá, nem a sua mulher; então compreendeu Manoá que era o anjo do Senhor. E disse Manoá à sua mulher: Certamente morreremos, porquanto temos visto a Deus. Porém sua mulher lhe disse: Se o Senhor nos quisesse matar, não aceitaria da nossa mão o holocausto e a oferta de alimentos, nem nos mostraria tudo isto, nem nos deixaria ouvir tais coisas neste tempo (Jz 13. 15 - 23 ACF).
E Isaías
No ano em que morreu o rei Uzias, eu vi também ao Senhor assentado sobre um alto e sublime trono; e a cauda do seu manto enchia o templo. Serafins estavam por cima dele; cada um tinha seis asas; com duas cobriam os seus rostos, e com duas cobriam os seus pés, e com duas voavam. E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória. E os umbrais das portas se moveram à voz do que clamava, e a casa se encheu de fumaça. Então disse eu: Ai de mim! Pois estou perdido; porque sou um homem de lábios impuros, e habito no meio de um povo de impuros lábios; os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos (Is 6. 1 - 5 ACF). 
Na verdade, nem mesmo a Glória do Senhor pode ser vista em todo o momento.
Dize a Arão, teu irmão, que não entre no santuário em todo o tempo, para dentro do véu, diante do propiciatório que está sobre a arca, para que não morra; porque eu aparecerei na nuvem sobre o propiciatório (Lv 16. 2 ACF).
Deus não pode ser visto face à face por homem algum. Daí que na Teofania do Sinai, ele desça em nuvens espessas e em densas trevas. Stott afirma que somente em Cristo Deus pode ser visto sem criar temor e terror nos homens. Do contrário eles não suportam o peso da presença e da manifestação de Deus.

No Novo Testamento as aparições de Deus para Hagar, para os anciãos que vão ao monte com Moisés, e para Gideão, Manoá e Isaías ganham novo significado. Em primeiro lugar vê-se ali afirmação clara de que o λογος (LOGOS), identificando com a sabedoria divina no judaísmo helênico, e agora com Cristo é Deus.
No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam (Jo 1. 1 - 5 ACF). 
De igual modo, entende-se no Novo Testamento que quem apareceu nas manifestações divinas foi o próprio Cristo.
Disse-lhes, pois, Jesus: A luz ainda está convosco por um pouco de tempo. Andai enquanto tendes luz, para que as trevas não vos apanhem; pois quem anda nas trevas não sabe para onde vai. Enquanto tendes luz, crede na luz, para que sejais filhos da luz. Estas coisas disse Jesus e, retirando-se, escondeu-se deles. E, ainda que tinha feito tantos sinais diante deles, não criam nele; Para que se cumprisse a palavra do profeta Isaías, que diz: Senhor, quem creu na nossa pregação? E a quem foi revelado o braço do Senhor? Por isso não podiam crer, entào Isaías disse outra vez: Cegou-lhes os olhos, e endureceu-lhes o coração, A fim de que não vejam com os olhos, e compreendam no coração, E se convertam, E eu os cure. Isaías disse isto quando viu a sua glória e falou dele (Jo 12. 35 - 41 ACF).  
Em outro texto, as palavras de Iahweh para Isaías são atribuídas ao Espírito Santo.
E, como ficaram entre si discordes, despediram-se, dizendo Paulo esta palavra: Bem falou o Espírito Santo a nossos pais pelo profeta Isaías, Dizendo:Vai a este povo, e dize:De ouvido ouvireis, e de maneira nenhuma entendereis;E, vendo vereis, e de maneira nenhuma percebereis. Porquanto o coração deste povo está endurecido,e com os ouvidos ouviram pesadamente,e fecharam os olhos,para que nunca com os olhos vejam,Nem com os ouvidos ouçam,Nem do coração entendam,E se convertam,E eu os cure (At 28. 25 - 27 ACF). 
Mas esta é uma percepção dos escritores e autores do Novo Testamento. Eles se tornaram convictos da divindade de Cristo, bem como de sua filiação divina a partir da ressurreição.  Foi assim com Tomé, que após tocar nas marcas dos cravos das mãos de Cristo disse: E Tomé respondeu, e disse-lhe: Senhor meu, e Deus meu! (Jo 20. 28 ACF). Paulo afirma que Jesus nasceu da descendência de Davi segundo a carne, mas, foi declarado Filho de Deus em poder, segundo o Espírito de santificação, pela ressurreição dentre os mortos, Jesus Cristo, nosso Senhor (Rm 1. 3, 4 ACF).

Na percepção de Willian Lane Craig, foi a ressurreição de Cristo, o fator principal a fazer com que judeus monoteístas vissem Cristo como Deus. Mas como explicar a relação entre as três pessoas da Trindade, melhor, a dinâmica existente entre as mesmas? Se a pergunta for: o que vem antes deste Deus? a resposta é mais do que óbvia. Isto porque perguntar pelo que vem antes de Deus equivale a perguntar pelo que vem da letra a.

Por no mínimo três vezes o Apocalipse traz a declaração de que Cristo é o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de vir, o Todo-Poderoso (Ap 1. 8 ACF), E disse-me mais: Está cumprido. Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. A quem quer que tiver sede, de graça lhe darei da fonte da água da vida (Ap 21. 6 ACF), Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, o primeiro e o derradeiro (Ap 22. 13 ACF).

Em segundo lugar vem a questão a respeito de como um único Deus pode ser três pessoas, ou substâncias. Mais uma vez se faz necessário recorrer a C. S. Lewis, Franklin Ferreira e cia. A dificuldade de entender um único Deus em três pessoas, ou substâncias decorre do pensamento lógico matemático. No tocante a explicação da realidade tridimensional (espaço, tempo e matéria), tudo bem, mas quando se fala no além tempo - algo que não está na percepção humana, visto que não há quem tenha relação com a atemporalidade.

É aqui que reside toda, ou grande parte da  questão.
A diferença é a seguinte: na geração, o que foi gerado é da mesma espécie que o gerador. Um homem gera bebês humanos, um castor gera castorzinhos e um pássaro  gera ovos de onde sairão outros passarinhos. Mas, quando fazemos algo, esses algo é de uma espécie diferente. Um pássaro faz um ninho, um castor constrói uma represa, um homem faz um aparelho de rádio - ou talvez algo um pouco mais parecido consigo mesmo que um rádio; uma estátua, por exemplo. Se for um escultor habilidoso, sua estátua se parecerá muito com um homem. Mas é claro que não será um homem de verdade; terá somente a aparência. Não poderá pensar, nem respirar. Não tem vida. 
Este é o primeiro ponto que precisamos deixar claro. O que Deus gera é Deus, assim como o que o homem gera é homem. O que Deus cria não é Deus, assim como o que o homem faz não é homem.
É neste sentido que os crentes são chamados para serem filhos de Deus. Tanto que o Novo Testamento emprega duas linguagens para se referir ao fato de cristãos se tornarem filhos de Deus. A primeira é a da adoção, a segunda é a da geração. Mas mesmo quando Paulo fala de adoção na carta aos Romanos, ele fala de um processo de conformação à imagem de Cristo.

Pensar a Trindade hoje consiste em pensar relacionamentos. Somos seres relacionais porque Deus se relaciona dinamicamente por meio de três pessoas e o modo pelo qual tal se dá é a glorificação mútua entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Conhecer a Deus não consiste somente em ter informações a respeito de Deus, ou dedicar-se a uma ciência chamada Teologia. Não!

O conhecimento de Deus dá-se na via relacional. E somente é possível relacionar-se com Deus por meio de Cristo Jesus, e com este por meio do Pai e do Espírito. Mas a relação com Deus é convite para que o homem se relacione com o seu próximo, conforme visto na oração sacerdotal.
E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela tua palavra hão de crer em mim; Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste. E eu dei-lhes a glória que a mim me deste, para que sejam um, como nós somos um. Eu neles, e tu em mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, e para que o mundo conheça que tu me enviaste a mim, e que os tens amado a eles como me tens amado a mim. Pai, aqueles que me deste quero que, onde eu estiver, também eles estejam comigo, para que vejam a minha glória que me deste; porque tu me amaste antes da fundação do mundo (Jo 17. 20 - 24 ACF). 
Somente o teísmo trinitariano explica relacionamento. Em Cristo, Marcelo Medeiros.
  

sábado, 8 de julho de 2017

O Único Deus verdadeiro e a criação


Segundo James Crenshau os israelitas nunca fizeram a mais decisiva das perguntas a respeito do ser, eles dão a questão do ser como algo dado. E mais a identidade humana dá-se a partir da existência mais do que óbvia deste SER. Do mesmo modo há inúmeras declarações de que há um único Deus. Mas exatamente por darem a existência de Deus como um dado que não há demonstrações sistemáticas da existência do mesmo. 

Desde Santo Tomás de Aquino tem sido uma via normal tomar a natureza e a organização da mesma como prova da existência de Deus. Este é o caminho de apologistas evidencialistas como Norman L. Geisler. O próprio R. C. Sproul aponta a necessidade de uma escolha entre Kant e Aquino. Ele o faz em sua Filosofia para Iniciantes. A leitura destas palavras fez com que optasse por Pascal, para quem somente por meio de Jesus Cristo, Deus pode ser acessado e conhecido. Estas são algumas abordagens a serem feitas no presente post com a ajuda de Deus. 

Biblicamente falando a existência de um único Deus é temática predominante da teologia do Deuteronômio. Não entrarei em maiores detalhes a respeito de data e autoria. Mas ao que parece Israel sai do Henoteísmo (que é o serviço exclusivo à Iahweh, para o monoteísmo, e o texto que segue abaixo transcrito deixa isto muito claro. Em algum momento Israel creu que os deuses das demais nações fossem deuses. A confissão de fé deuteronomista solapa com esta crença. 
A ti te foi mostrado para que soubesses que o Senhor é Deus; nenhum outro há senão ele [...] Por isso hoje saberás, e refletirás no teu coração, que só o Senhor é Deus, em cima no céu e em baixo na terra; nenhum outro há (Dt 4. 35 - 39 ACF). 
Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor (Dt 6. 4 ACF).
Saberás, pois, que o Senhor teu Deus, ele é Deus, o Deus fiel, que guarda a aliança e a misericórdia até mil gerações aos que o amam e guardam os seus mandamentos (Dt 7. 9 ACF).
Vede agora que eu, eu o sou, e mais nenhum deus há além de mim; eu mato, e eu faço viver; eu firo, e eu saro, e ninguém há que escape da minha mão (Dt 32. 39 ACF).  
A criação é biblicamente ligada à eleição de Abraão, e ao fato de haver um único Deus.
Só tu és Senhor; tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto neles há, e tu os guardas com vida a todos; e o exército dos céus te adora. Tu és o Senhor, o Deus, que elegeste a Abrão, e o tiraste de Ur dos caldeus, e lhe puseste por nome Abraão (Ne 9. 6, 7 ACF). 
Mesmo admitindo a  existência de outros deuses, os poetas afirmam que nenhum deles é similar a Iahweh.
Entre os deuses não há semelhante a ti, Senhor, nem há obras como as tuas. Todas as nações que fizeste virão e se prostrarão perante a tua face, Senhor, e glorificarão o teu nome. Porque tu és grande e fazes maravilhas; só tu és Deus (Sl 86. 8 - 10 ACF). 
Neste texto ainda se admite a possibilidade de outros deuses, embora já exista o conceito de que os deuses das nações são obra das mãos dos homens.
são prata e ouro, obra das mãos dos homens. Têm boca, mas não falam; olhos têm, mas não vêem. Têm ouvidos, mas não ouvem; narizes têm, mas não cheiram. Têm mãos, mas não apalpam; pés têm, mas não andam; nem som algum sai da sua garganta (Sl 115. 4 - 7 ACF).
Mas os profetas não deixarão margem para dúvida alguma. Pelo contrário, neles se afirmará:
Vós sois as minhas testemunhas, diz o Senhor, e meu servo, a quem escolhi; para que o saibais, e me creiais, e entendais que eu sou o mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá. Eu, eu sou o Senhor, e fora de mim não há Salvador (Is 43. 10, 11 ACF).
Assim diz o Senhor, Rei de Israel, e seu Redentor, o Senhor dos Exércitos: Eu sou o primeiro, e eu sou o último, e fora de mim não há Deus. Não vos assombreis, nem temais; porventura desde então não vo-lo fiz ouvir, e não vo-lo anunciei? Porque vós sois as minhas testemunhas. Porventura há outro Deus fora de mim? Não, não há outra Rocha que eu conheça  (Is 44. 6, 8 ACF). 
Eu sou o Senhor, e não há outro; fora de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que tu não me conheças; Para que se saiba desde o nascente do sol, e desde o poente, que fora de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro. Assim diz o SENHOR: O trabalho do Egito, e o comércio dos etíopes e dos sabeus, homens de alta estatura, passarão para ti, e serão teus; irão atrás de ti, virão em grilhões, e diante de ti se prostrarão; far-te-ão as suas súplicas, dizendo: Deveras Deus está em ti, e não há nenhum outro deus (Is 45. 5, 6, 14 ACF).  
Esta mesma fórmula se repete no Novo Testamento.
Aproximou-se dele um dos escribas que os tinha ouvido disputar, e sabendo que lhes tinha respondido bem, perguntou-lhe: Qual é o primeiro de todos os mandamentos? E Jesus respondeu-lhe: O primeiro de todos os mandamentos é: Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor (Mc 12. 29 ACF).  
Assim que, quanto ao comer das coisas sacrificadas aos ídolos, sabemos que o ídolo nada é no mundo, e que não há outro Deus, senão um só (I Co 8. 4 ACF).  
Um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós (Ef 4. 4 ACF).  
Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem (I Tm 2. 5 ACF).  
Mas como ele se relaciona com a criação? Em primeiro lugar é biblicamente afirmado que Deus é o criador dos céus a da terra.
No princípio criou Deus o céu e a terra (Gn 1. 1 ACF).
Que foram feitos pela Palavra de Deus.
Pela palavra do Senhor foram feitos os céus, e todo o exército deles pelo espírito da sua boca (Sl 33. 6 ACF).  
Louvem o nome do Senhor, pois mandou, e logo foram criados (Sl 148. 5).
Pela fé entendemos que os mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente (Hb 11. 3 ACF).
perceba que o entendimento de que os céus e a terra são obra das mãos de Deus procede de fé. Pela pura e simples razão não se alcança tal entendimento. Faço uso da expressão pela pura e simples razão, por entender que a fé não se opõe ao intelecto.  A expressão νοουμεν (noomen), advém do verbo νοιέω (noiéoo), cujo sentido é o de exercitar a mente, observar, perceber, entender, compreender. Na mentalidade dos autores bíblicos não existe oposição entre fé e entendimento. 


A Bíblia também dá a entender que Deus se distingue de sua criação, embora se faça presente na mesma, não se confunde com esta. Ele é eterno, mas a sua criação passará. 

Desde a antiguidade fundaste a terra, e os céus são obra das tuas mãos. Eles perecerão, mas tu permanecerás; todos eles se envelhecerão como um vestido; como roupa os mudarás, e ficarão mudados. Porém tu és o mesmo, e os teus anos nunca terão fim (Sl 102. 25 - 27 ACF).  
É igualmente afirmado que a criação é mantida e sustentada pelo próprio Deus. Na Teologia Sistemática de Berkoff o autor abre uma discussão a respeito da dinâmica de vida e morte na criação. Mas é com Adauto Lourenço que vem luz sobre a matéria. Por estar ligada ao tempo, a matéria é sujeita à mudança. Se é assim, como explicar a entrada da morte através do pecado, conforme se vê na cosmovisão bíblica. 

Adauto Lourenço afirma que a matéria, como toda a criação foi feita para ser sustentada por Deus. Assim, o norte estende sobre o vazio; e suspende a terra sobre o nada (Jó 26. 7 ACF), faz subir os vapores das extremidades da terra; faz os relâmpagos para a chuva; tira os ventos dos seus tesouros (Sl 135. 7 ACF), Jeremias diz que: fazendo ele soar a sua voz, logo há rumor de águas no céu, e faz subir os vapores da extremidade da terra; faz os relâmpagos para a chuva, e dos seus tesouros faz sair o vento (Jr 10. 13 ACF). 

Deus não é somente criador, ele é mantenedor da natureza. Ele faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos (Mt 5. 45 ACF). O Deus que fez o mundo e tudo que nele há, sendo Senhor do céu e da terra, não habita em templos feitos por mãos de homens; Nem tampouco é servido por mãos de homens, como que necessitando de alguma coisa; pois ele mesmo é quem dá a todos a vida, e a respiração, e todas as coisas (At 17. 24, 25 ACF). 

Longe de me por contra a comunidade científica, há que se observar que do ponto de vista cristão é inviável a afirmação de que a natureza seja obra do acaso. Conheço alguns esboços de síntese entre pensamento cristão e científico, mas não abro mão do pressuposto de que o Universo exibe sim uma inteligência ímpar. Não há espaço para o acaso. Neste estudo faço algumas observações que julgo pertinentes a respeito da criação, mas citarei uma fala a respeito da inteligência da criação. 
Sir James Jeans, o famoso astrônomo britânico disse certa vez: “o universo parece ter sido desenhado por um matemático puro”. Joseph Campbell escreveu também sobre “a intuição de uma ordem cósmica matematicamente definível”. Contemplando a ordem da Terra, do Sistema Solar e do Universo estelar cientistas e estudiosos concluíram que o grande projetista não deixou nada para o acaso.A inclinação da terra, por exemplo, de 23 graus, produz as nossas estações. Os cientistas dizem-nos que, se a terra não tivesse a inclinação que tem, os vapores dos oceanos mover-se-iam para norte e sul cobrindo os continentes de gelo. Se a lua estivesse a 80 mil quilômetros da terra, em vez de 320 mil, as marés seriam tão enormes que todos os continentes seriam submergidos pela água – até as montanhas seriam afetadas pela erosão. Se a crosta terrestre fosse apenas três metros mais grossa, não haveria oxigênio, e sem ele toda vida animal morreria. Se os oceanos fossem uns poucos metros mais profundos, o dióxido de carbono e o oxigênio teriam sido absorvidos e nenhuma vida vegetal poderia existir. O peso da terra estimado em seis sextilhões de toneladas (isto é um seis seguido de vinte e um zeros). Ela tem, ainda assim, um equilíbrio perfeito, e gira com facilidade em torno do seu eixo. Ela revolve diariamente à razão de mais de mil e seiscentos quilômetros por hora, ou quarenta mil quilômetros por dia. Num ano isto dá mais de catorze milhões de quilômetros. Considerando o extraordinário peso de seis sextilhões de toneladas, girando a essa fantástica velocidade ao redor do seu eixo invisível, as palavras de Jó 26. 7 assumem significado sem paralelo: “Ele ... faz pairar a terra sobre o nada”. Jó nos convida ainda a meditar sobre “as maravilhas de Deus” (Jó 37. 14). Considere o sol. Cada metro quadrado da superfície do sol emite constantemente um nível de energia de cento e trinta mil cavalos força (isto é aproximadamente 450 motores de oito cilindros [...]. Ainda assim o sol é apenas uma estrela menor nos cem bilhões de astros que compõem a nossa via Láctea [...] quando tentamos apreender mentalmente as quase incontáveis estrelas e outros corpos celestes, encontrados na nossa Via Láctea, apenas, somos levados a ecoar o hino de louvor de Isaías ao poderoso criador: “Levantai ao alto os olhos e vede. Quem criou estas coisas? Aquele que faz sair o seu exercito de estrelas, todas bem contadas, as quais ele chama pelo nome, por ser ele grande em força e forte em poder, nem uma só vem a faltar (MANNING, 2005).
Norman L. Geisler aponta para uma infinidade de fatores em seu livro Não Tenho Fé Suficiente para ser Ateu. A perspectiva é tomista, visto que o autor é um tomista. A despeito da fala de Sproul, para quem há de se fazer uma escolha entre Santo Tomás de Aquino e Kant (que desestabilizou a maioria dos argumentos que demonstravam a existência de Deus). Para mim existe a via do meio: Pascal. 

Para Pascal a natureza só revela Deus para quem tem a luz da fé acesa em seu coração. Fora disto Deus só pode ser conhecido por meio de Jesus Cristo. Face ao que foi dito pelo autor, tudo o que posso dizer é que sem a graça a revelação da natureza se transforma em sensação estética. 

Sobre o Evolucionismo: não há como negar o surgimento e o desaparecimento de algumas espécimes, a mutação biológica também, ainda que não existam provas de que estas dêem origem a outras espécimes, mas a variações de uma mesma - é o que ocorre entre cachorros, por exemplo - mas este é um longo debate. 

Marcelo Medeiros, em Cristo.   

A Inspiração divina e a Autoridade da Bíblia


A verdade prática da lição numero um afirma o cremos da Assembleia de Deus. Um credo que preconiza a crença na inspiração divina, plenária e verbal das Escrituras. Além de colocar a mesma como regra de fé e prática dos crentes. Tal afirmação é na verdade, um líbelo contrário aos apelos à tradição, ou às complementaridades tais como o espírito de profecia, revelações trazidas por anjos e outras produções que possam vir a ocupar algum espaço na formação da fé. o presente estudo gravita em torno das afirmações pertinentes às Escrituras constantes no cremos.

Um credo é uma doutrina, programa ou conjunto de princípios por que se rege uma pessoa, uma comunidade, um partido etc. Esta é a definição do dicionário Michaelis. É um modo de professar a fé, externar as convicções e sustentar as crenças, afirmar-se. Reconhecer a inspiração das Escrituras é na percepção dos elaboradores do cremos afirmar a suprema autoridade da mesma. Mas face às teologias denominacionais, cabe perguntar: até que ponto, de fato, a Bíblia é a regra de fé e prática para nós cristãos?


A pergunta é pertinente visto que não se segue à risca determinados preceitos da lei levítica, por exemplo. A leitura de Entendes o que lês? de autoria de Gordon Fee e Douglas Stuartt, pode-se ver que mesmo considerando o caráter inspirado da lei, há que se levar em conta o inconteste fato de que ao longo das Escrituras toda a lei vai sendo revisada, e tanto Cristo quanto Paulo seguem no trabalho de revisão da mesma.


Segue então que entender a inspiração da Bíblia consiste na correta percepção do propósito da mesma. Com que intuito as Escrituras foram reveladas? Com que finalidade a lei foi dada, os profetas foram levantados, e os sábios judeus refletiram as questões sobre as quais se debruçaram? Há que se adiantar que a Bíblia não é um livro de ciência, não pretende fazer afirmações sobre geologia, astronomia, filosofia, sociologia, biologia, e nem mesmo sobre ética. Mas qual é a matéria da Bíblia?
Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, E que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus. Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça; Para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra (II Tm 3. 14 - 17 ACF). 
A expressão tu porém, contrapõe o que a antecede. Os homens maus seguirão enganando e sendo enganados. Enganando os incautos, os cheios de pecados e sendo enganados pelo seu aparente sucesso. Eles sempre resistirão à verdade. Em contraposição ao enganos dos homens maus e à resistência dos mesmos à verdade, Paulo apresenta o seu exemplo. 

Em seguida a essência das Escrituras é apresentada ao jovem Timóteo. Elas são as ιερα γραμματα οιδας τα δυναμενα σε σοφισαι εις σωτηριαν δια πιστεως της εν χριστω ιησου (iera grammata oidas ta dinamena se sophisai eis soterian dia pisteoos tees en Christoo Iesou - sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus). A expressão ιερα é possivelmente o feminino de ίερός, cujo sentido pode ser o de sagrado, ou de consagrado a Deus. 

Γραμματα é uma variação de Γραμμα, expressão da qual procede a nossa palavra gramática, e que significa letra, um escrito e mesmo um desenho. Ao lado de ιερα, passa a ter o sentido de sagradas letras. Teologicamente falando, o sagrado vem a ser aquilo que se torna digno de veneração, ou respeito em razão de sua associação para com Deus, ou para com o divino, ou no caso das religiões em que não há o conceito de deus, ou deuses, aquilo que transcende a ordem do humano e do natural. 

A perda da Autoridade da Bíblia não pode ser creditada exclusivamente à emergência de teologias progressistas, ou de fontes secundárias que venham a competir com as mesmas. Não! Parte da perda da autoridade da Bíblia se dá na relação desta com a dessacralização da religião e de tudo o mais. Andar com uma Bíblia nas mãos, ou ler a mesma seja em que suporte for, é aproximar-se do sagrado. 

שְׁמַ֖ע יִשְׂרָאֵ֑ל (shemá Israel - ouve Israel), veio a ser tanto a oração quanto a confissão de fé judaica. No desdobramento deste é ordenado que Deus seja amado de todo o coração, alma e força. E o desdobramento deste amor é que as palavras ordenadas por Deus estejam no coração e na boca do povo, que sejam ensinadas aos filhos, e tudo o mais. Mas sem o שְׁמַ֖ע יִשְׂרָאֵ֑ל todo esforço se perde. Israel precisa ouvir porque é Deus quem fala. 

No Sinai falou por meio de uma tempestade, aos profetas através da palavra e na sabedoria e demais escritos através da atividade mental. Meditar nas escrituras é permitir que Deus ensine diretamente à mente. Louvarei ao Senhor que me aconselhou; até os meus rins me ensinam de noite (Sl 16. 8 ACF). Perceba que a associação entre a reflexão e a divindade confere caráter sagrado àquela. 

As Escrituras possuem o poder de fazer o homem sábio para a salvação que há em Cristo. De certa forma esta afirmação se faz presente na lei quanto se lê: 
 Guardai-os pois, e cumpri-os, porque isso será a vossa sabedoria e o vosso entendimento perante os olhos dos povos, que ouvirão todos estes estatutos, e dirão: Este grande povo é nação sábia e entendida. Pois, que nação há tão grande, que tenha deuses tão chegados como o Senhor nosso Deus, todas as vezes que o invocamos? (Dt 4. 6, 7 ACF). 
Mais do que um código jurídico elaborado, a lei visa ser uma fonte de sabedoria, cujo alcance dá-se por meio da relação que a mesma cria entre o homem e Deus.  O temor do Senhor, ao lado da guarda fiel dos mandamentos complementará a receita para uma vida de sabedoria. O temor do Senhor, eis a sabedoria, o fugir do mal, eis a inteligência (Jó 28. 28 Bíblia de Jerusalém). O temor de Iahweh é puro e alumia o coração (Sl 19. 10 [9] Bíblia de Jerusalém). 

Mas a revelação de Deus em Cristo trouxe uma outra perspectiva: a de que neste se cumpriam as expectativas da sabedoria dos sábios, pois Jesus Cristo, [..] foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção (I Co 1. 30 ACF), sim, nele estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência (Cl 2. 3 ACF). Assim, revelar a Cristo passa a ser o alvo supremo das Escrituras. Afinal, debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos (At 4. 12 ACF). 

Isto posto, necessário se faz afirmar que a Bíblia não é um livro de ciência (na acepção moderna da palavra). Não se encontra na mesma uma única palavra a respeito de como explicar, descrever e dominar a natureza. Nada há na mesma a respeito de uma vida mais fácil. Isto pode ser encontrado no filósofo da ciência Francis Bacon. Quando os astros são descritos na Bíblia, o são de forma poética. O interesse dos escritores ali está na revelação de Deus através da natureza. 

De igual modo não na mesma Bíblia uma única palavra a respeito de soluções para problemas sociais, históricos, econômicos. A Bíblia, reitero, não é um tratado de ciência. O problema que ela pretende resolver é de uma natureza distinta dos que a ciência visa resolver. De acordo com Timothy Keller, não há porque opor fé e ciência, quando ambas podem sim dialogar. Mas o diálogo demanda que ambas se situem em seus respectivos lugares e importância nas humanidades. 

Somente a Bíblia aponta para Cristo. É isto que lhe confere caráter sagrado. Se ela fosse ciência, não seria sagrada, uma vez que com exceção das ciências da Religião, ciência alguma objetiva o sagrado. Na verdade, sequer é capaz de perceber o sagrado. Pode no máximo descrever como os homens se comportam diante daquilo que consideram como sagrado. 

Πασα γραφη θεοπνευστος, conforme explicitado por Esequias Soares, πασα é o termo feminino para πασ, cujo significado é o de todo, sendo o termo anterior equivalente a toda. O Novo Testamento interlinear da Sociedade Bíblica do Brasil, deixa implícito o artigo e o verbo ser ausentes no texto grego. Assim, no lugar de Toda Escritura divinamente inspirada, tem-se toda a Escritura é divinamente inspirada

Uma mudança aparentemente sutil, mas que produz uma alteração notável. O artigo sugere que não é qualquer escrito, mas um tipo específico. O verbo afirma que a totalidade deste foi inspirada por Deus. Assim, cada seção da Bíblia tem o sêlo de autenticação da inspiração divina. A Torah é palavra de Deus, visto que a cada mandamento se percebe a presença das palavras introdutórias: 
Porque eu sou o Senhor vosso Deus; portanto vós vos santificareis, e sereis santos, porque eu sou santo; e não vos contaminareis com nenhum réptil que se arrasta sobre a terra; Porque eu sou o Senhor, que vos fiz subir da terra do Egito, para que eu seja vosso Deus, e para que sejais santos; porque eu sou santo (Lv 11. 44, 45 ACF). 
Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão; Não terás outros deuses diante de mim (Dt 5. 6, 7 ACF).
A evocação à obediência é feita sob o prisma do senhorio divino. Aqui há que se lembrar que tais palavras foram transmitidas durante uma teofania, a do Sinai. O espanto mediante a mesma tem como finalidade produzir um temor que os livre de pecar. Moisés ao povo: Não temais, Deus veio para vos provar, e para que o seu temor esteja diante de vós, a fim de que não pequeis (Ex 20. 20 ACF). Na verdade, pela misericórdia e verdade a iniqüidade é perdoada, e pelo temor do Senhor os homens se desviam do pecado (Pv 16. 8 ACF). 

Os profetas vindicam inspiração para si mediante a expressão: Assim diz o Senhor (II Rs 22. 15; Jr 45. 2; Ez 21. 9; Am 5. 4; Ag 1. 5, 7; Zc 8. 14). Nas palavras de Isaías: Ouvi, ó céus, e dá ouvidos, tu, ó terra; porque o Senhor tem falado (Is 1. 2 ACF). A profecia é Deus falando para um povo que não atentou para a lei. Na verdade, cada profeta é um tipo de Moisés, seja pelos sinais que apresenta, seja pela palavra fiel à lei.

Se a lei é palavra de Deus, e os profetas idem, o mesmo pode ser dito em relação ao Evangelho. Primeiro, por se tratar da proclamação de Jesus e do ensinamento (At 5. 42), segundo por Cristo ter afirmado: A minha doutrina não é minha, mas daquele que me enviou (Jo 7. 16 ACF), também disse: Quando levantardes o Filho do homem, então conhecereis que EU SOU, e que nada faço por mim mesmo; mas isto falo como meu Pai me ensinou (Jo 8. 28 ACF). Aos seus discípulos afirmou: a palavra que ouvistes não é minha, mas do Pai que me enviou (Jo 14. 24 ACF), sendo que neste contexto, as palavras estão em conexão com as orientações de Cristo.

Diante da rejeição aos seus ensinos, sua obra e missão, e tudo por causa da glória dos homens, Jesus afirmou:
E se alguém ouvir as minhas palavras, e não crer, eu não o julgo; porque eu vim, não para julgar o mundo, mas para salvar o mundo. Quem me rejeitar a mim, e não receber as minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia. Porque eu não tenho falado de mim mesmo; mas o Pai, que me enviou, ele me deu mandamento sobre o que hei de dizer e sobre o que hei de falar. E sei que o seu mandamento é a vida eterna. Portanto, o que eu falo, falo-o como o Pai mo tem dito (Jo 12. 47 - 50 ACF). 
À semelhança dos profetas: 1) Jesus não falava de si mesmo; 2) falava por mandamento do Pai ; 3) ao falar era fiel à palavra do Pai. Tanto que o Evangelho (a pregação e ensino de Jesus), também é palavra de Deus. Escrevendo aos irmãos de Tessalônica, Paulo lhes diz: Por isso também damos, sem cessar, graças a Deus, pois, havendo recebido de nós a palavra da pregação de Deus, a recebestes, não como palavra de homens, mas (segundo é, na verdade), como palavra de Deus, a qual também opera em vós, os que crestes (I Ts 2. 13 ACF).

Perceba que a palavra da pregação é Palavra de Deus, e está agindo entre eles, os crentes, ou os que creram.
Sendo de novo gerados, não de semente corruptível, mas da incorruptível, pela palavra de Deus, viva, e que permanece para sempre. Porque toda a carne é como a erva,e toda a glória do homem como a flor da erva.Secou-se a erva, e caiu a sua flor; Mas a palavra do Senhor permanece para sempre.E esta é a palavra que entre vós foi evangelizada (I Pe 1. 23 - 25 ACF). 
Da mesma forma que a Palavra criou o mundo ele produz novos seres humanos, com a diferença de que a criação foi ex nihilo, ou do nada, ao passo que a regeneração dá-se a partir de uma massa corrompida de caída. Neste texto Pedro equipara o Evangelho à palavra profética. Assim, a lei, os profetas e o Evangelho são palavra de Deus.

Nos Escritos paulinos, percebe-se, ao mesmo tempo, uma vindicação de autoridade. O ensino dos dons espirituais é um exemplo, quando Paulo afirma: Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor (I Co 14. 37 ACF). Mas na questão do casamento ele afirma em algumas ocasiões que está emitindo sua opinião pessoal, ou particular.
Digo, porém, isto como que por permissão e não por mandamento. Porque quereria que todos os homens fossem como eu mesmo; mas cada um tem de Deus o seu próprio dom, um de uma maneira e outro de outra. Digo, porém, aos solteiros e às viúvas, que lhes é bom se ficarem como eu. Mas, se não podem conter-se, casem-se. Porque é melhor casar do que abrasar-se (I Co 7. 6 - 9 ACF). 
Mas na sequência do próprio texto ele afirma que vai transmitir um mandamento do Senhor: Todavia, aos casados mando, não eu mas o Senhor, que a mulher não se aparte do marido (I Co 7. 10 ACF).

Ao afirmar que as Escrituras são sopradas por Deus, o apóstolo está dizendo que a motivação da outorga da lei, do movimento profético e da própria pregação por Jesus e pelos apóstolos não é de natureza humana, mas divina. Tanto nos profetas quanto em Cristo percebe-se o mover do Espírito, mais do que um mover, um ímpeto.

Feitas as considerações a respeito das respectivas divisões da Bíblia, há que se considerar os chamados escritos deuterocanônicos e os apócrifos. Em Mt 6. 14 há uma clara citação de Eclo 28. 1, 2. O livro de Enoque é claramente citado por Judas e por Pedro (En Etíope 1. 6; II Pe 2. 4; Jd 6, 7). Particularmente acho cansativa a discussão a respeito da inspiração, ou não inspiração destes escritos. Me lembro perfeitamente bem que um dos critérios ensinados era o da citação do livro no Novo Testamento.

Uma questão é mais do que certa ao se abordar os livros deuterocanônicos e apócrifos: a de que sem a leitura dos mesmos o ambiente do Novo Testamento não é corretamente apreendido. A demonologia do Antigo Testamento, por exemplo, não é muito elaborada. Sem a leitura de Tobias e Enoque não se compreende as palavras de Paulo em Ef 6. 10ss. Que seres são estes que estão nas regiões celestiais. O livro de Enoque sugere, e possivelmente Paulo esteja fazendo uma menção ao conteúdo deste livro.

A questão da imortalidade e da ressurreição é outro exemplo. No primeiro caso a primeira afirmação clara vem do livro de Sabedoria. No segundo há espaças menções em Is 26. 19, e Dn 12. 2, 3. Os livros de Macabeus e Enoque aprofundarão ainda mais a questão. O que fica indicado é que ainda que não haja uma relação de um cânon claro, os livros deuterocanônicos e os apócrifos de alguma forma influenciarão a cultura do Novo Testamento. Observações à parte, cânon, é uma questão que merece um post especial neste espaço.

Todavia, um último exemplo se faz necessário. Quando se estuda a respeito do inferno, por exemplo, percebe-se uma correlação entre os termos שְׁאֹ֣ול (sheol) e αδης (hades). Mas nem de longe são a mesma coisa. O primeiro pode ser uma cova, um abismo, ou o mundo dos mortos. O segundo é o nome de um deus grego que rege o submundo e os habitantes de lá.

As Escrituras são úteis para ensino (διδασκαλιαν - disdaskalian), redarguir (ελεγχον - elegchon), corrigir (επανορθωσιν - epanortoosin), e instruir, ou educar em justiça (παιδειαν την εν δικαιοσυνη - paidean ten en dikaiosynee). Διδασκαλιαν é o termo para doutrina e instrução. Com isto se quer dizer que as Escrituras inspiradas por Deus são matéria para ensino. Mesmo não sendo fonte de conhecimento científico e matéria técnica, o são de doutrina. 

Nossas versões traduzem ελεγχον por redarguir, cuja definição é a de responder a acusação com outra acusação. Este mesmo termo aparece em Jo 16. 8 para a ação do Espírito em convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo, sendo que neste texto a Bíblia de Jerusalém traduz ελεγχον por estabelecer a culpabilidade. Em Ap 3. 19 aparece como repreender. Ao mesmo tempo em que ensinam as Escrituras são fonte de denúncia de nossos erros e pecados.

Επανορθωσιν é, na percepção de Cleon Rogers um termo procedente do mundo militar cujo sentido é o de colocar uma tropa em linha. Aparece apenas neste texto. Indica que o propósito da Palavra de Deus consiste em acertar o homem de modo a colocar o mesmo em ordem, ou linha. E por último παιδειαν.

Esta é uma expressão cujo significado pode ser tanto o de castigo quanto de educação. Em Ap 3. 19 é castigo, em Hb 12. 6, 7 pode ser tanto correção, quando disciplina. Fato é que a παιδεια produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela (Hb 12. 11 ACF). Deus a emprega para nosso proveito, para sermos participantes da sua santidade (Hb 12. 10 ACF). Eis o que as Escrituras produzem no coração daquele que lê, ouve e guarda a palavra.

Marcelo Medeiros, em Cristo.
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