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sábado, 11 de outubro de 2014

Daniel, nosso contemporâneo



Em razão da pressa, bem como da necessidade de estar conciliando demandas familiares e acadêmicas, publicarei este estudo da forma mais resumida possível. Um grande problema que vejo com relação ao estudo do livro de Daniel, se dá em relação aos frequentes abusos exegéticos que este livro sofre. Sempre que alguma agitação ocorre no cenário mundial as pessoas tendem a interpretar as visões do livro como sendo referência a algum evento atual. Isto ocorreu em meados de 2001 em decorrência da queda das torres gêmeas do World Trade Center, e está ocorrendo neste exato momento em decorrência da propagação do ebola. Tal fato demanda um estudo sério do livro de Daniel. 

AUTORIA 

Há controvérsias a respeito de quando o livro de Daniel tenha sido escrito. fazer esta definição é de suma importância para a definição da autoria. Os autores críticos, partindo do pressuposto de que qualquer vaticínio a respeito do futuro seja inviável coloca o livro no sec. II a. C. Embora a teoria crítica tenha, do ponto de vista exegético os seus aspectos positivos, discordo quanto a este pressuposto. 

Do ponto de vista Hermenêutico, vejo que os fatos desenvolvidos durante a dinastia dos Selêucidas, e registrados no livro deuterocanônico de Macabeus, são bem mais robustos enquanto explicação para as visões registradas no livro em apreço, particularmente nos capítulos 2, 7, 8, e 11. É justamente aí que me afino com esta exegese. Mas discordo com o pressuposto de quem é inviável a predição do futuro. 

Do ponto de vista humano ele é sim, mas do prisma divino não, uma vez que para Deus não há nada impossível (Lc 1. 37; 18. 27). A profecia bíblica parte de um pressuposto de que Deus conhece o futuro e revela este futuro aos seus. Este pressuposto se encontra no livro em apreço. Daniel afirma a respeito de Deus: Seja bendito o nome de Deus de eternidade a eternidade, porque dele são a sabedoria e a força; E ele muda os tempos e as estações; ele remove os reis e estabelece os reis; ele dá sabedoria aos sábios e conhecimento aos entendidos. Ele revela o profundo e o escondido; conhece o que está em trevas, e com ele mora a luz (Dn 2. 20 - 22 ACF). 

Em outras palavras a Bíblia é o registro da revelação de Deus ao homem, sendo que este mesmo Deus conhece o futuro e usa os sonhos, ou visões noturnas como instrumento de comunicação de sua vontade, vedando o segredo dos mesmos aos descrentes, e ampliando o conhecimento aos fieis. Com isto fica claro que nem as artes mágicas, nem os encantamentos das nações são o suficiente para desvendar os mistérios do futuro [aqui e aqui]. 

Ao solapar este pressuposto a teoria crítica coloca em xeque a pressuposição revelacional das Escrituras, e mais o faz a partir de um fundamento questionável. É mais do que certo que não é comum ver pessoas fazendo previsões do futuro e acertando de forma inquestionável e infalível, mas isto não quer dizer que seja impossível um Deus que revela o futuro. Na verdade, não está no plano das possibilidades humanas determinar o que é, ou não possível. 

E é justamente por este motivo a minha predileção da autoria de Daniel. Afirmar que o livro seja produto de pseudonímia não seria problema algum caso o ônus desta afirmativa não fosse o solapar dos pressuposto que afirma um Deus agindo na história em favor do seu povo, e revelando esta mesma história aos seus profetas. 

Atribuir a autoria a um autor que usou de pseudonímia, que viveu durante a ocorrência dos fatos registrados em forma de visão solapa também a interpretação crítica de que o livro é um escrito em tempos de perseguição e aflição, uma vez que a consolação aqui proposta se baseia em uma mentira. Sim a posição crítica coloca o livro como mera obra de ficção. Conforme dito supra, tenha razões para não aceitar tal pressuposto. 

O CONTEXTO HISTÓRICO

Do ponto de vista crítico as histórias do livro de Daniel se desenrolam durante a era dos Selêucidas, no período dos Macabeus. Já expus supra o meu problema com o prisma crítico, mas tenho de expor aqui a argumentação dos mesmos. Um dos maiores argumentos dos mesmo em prol de uma data mais próxima são as incoerências históricas. 

Há pouco tempo nada se sabia de Belsazar, e como lidar com a ausência de menção à pessoa de Nabônido, filho de Nabucodonozor. Hoje se sabe que aquele tenha sido o provável rei que passou pelo problema da loucura narrada no capítulo quatro do livro. Hoje se sabe que Nabônido teve um filho por nome Bel-Saar-Usur, cujo nome pode ser transliterado da seguinte forma: que Bel proteja o rei. 

O significado deste nome associado ao registro de que em uma festa este rei levou os vasos da casa do Senhor para que fossem profanados dá um novo sentido ao livro, e um colorido à narrativa. A festa se torna um palco para o duelo entre Bel e Jeová, sendo este o vitorioso do embate, uma vez que o rei sacrílego é julgado durante o banquete. 

Todavia o problema de Dário ainda se apresenta como insolúvel. Várias hipóteses foram levantadas com a finalidade de solucionar a ausência de menção a um rei vassalo da Média no trono da Babilônia. A mais aceita é a de Shea. Esta hipótese foi publicada no Brasil e difundida por meio de um livro da melhoramentos intitulado E a Bíblia Tinha Razão. De acordo com a mesma Dario é ninguém menos do que Gubaru da crônica de Nabônides (que exerceu a co regência com Cambises-Ciro). A suposição ainda que não conclusiva, do contrário não seria suposição, tem sido mantida como explicação viável. 

Os reformado são unânimes em afirmar que não há necessidade de dúvidas quanto as informações prestadas no livro em apreço, e que a história de Daniel se dá em meados de 605 a. C. e segue com o desaparecimento da supremacia babilônica em 539 a. C. 

ESTILO

A narrativa e as visões de Daniel não se parecem em nada com o estilo literário dos profetas. Os profetas falam: Assim diz o Senhor (II Rs 3. 16, 17; 4. 43; 9. 6, 12; I Cr 21. 10; II Cr 34. 23), ou veio a mim a palavra do Senhor dizendo (Jr 1. 4, 11, 13; 2. 1; 13. 8; 16. 1; 18. 5; 24. 4; Ez 11. 14). Daniel, ao contrário do profeta comum, é um visionário, o que o aproxima bastante do estilo dos apocalipsista. 

Há muito a ser dito a respeito deste gênero literário, mas para fins de melhor compreensão preciso manter o meu foco no principal. A principal diferença entre a profecia e a apocalíptica está no uso de profecias antigas como meio de desvendamento do futuro e no emprego de visões e simbolismos para a transmissão da mensagem. O apocalipse é um estilo literário típico de tempos de perseguição. Fato é que mesmo dentro do contexto babilônico as condições de Daniel e de seus amigos nem sempre são descritas como sendo favoráveis (Dn 2; 3). 

Para todos os efeitos a mensagem por meio de visões (Dn 2. 19, 31; 7. 2; 8. 1, 2; 10. 1, 7, 8) e as constantes explicações (Dn 8. 15 - 17; 9. 23, 24; 10. 14, 16) a respeito do teor das mesmas são marcas distintivas do estilo literário conhecido como Apocalipse. Ao que parece o livro emprega חָזֹ֖ון  (hazon) nas seguintes passagens (Dn 1. 17; 8. 1, 2, 13, 17, 26; 9. 21, 24; 10. 16). Nestes o sentido é o de visão mental, sonho, revelação, ou mesmo o de uma figura mental quando alguém está acordado. 

O termo חֶזְוָ֥א (hezev) é usado para expressar um sinal, ou visão. Já מַּרְאָ֔ה (maranh) expressa uma visão tal como a que se tem diante de um metal polido, como no caso do bronze (Dn 10. 7, 8, 16), podendo ser aplicada o sonho de Faraó (Gn 46. 2), ou às visões que Deus dava aos profetas da antiga dispensação (Nm 12. 6). 

A mensagem de Daniel é bem simples: o povo aguarda a restauração do Reino, mas o que virá após o cativeiro não é nada bom, e a visão das setenta semanas deixa isto bem claro. Israel terá que viver sob a dominação estrangeira por um bom tempo, e o Messias em quem depositam suas esperanças será morto, o santuário será invadido e haverá guerra até o fim (Dn 9. 26). Creio que foi com este sentido que Cristo se apropriou das mensagens proféticas descritas no livro em apreço. 

Em Cristo, Marcelo Medeiros. 

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