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sábado, 8 de março de 2014

As Leis civis entregues por Moisés aos israelitas


Já elaborei um post a respeito do decálogo e na ocasião afirmei que o mesmo é um resumo de um complexo código de aproximadamente seiscentos e treze (ou seiscentos e dezoito, na opinião de alguns) mandamentos, estatutos e leis que Deus mesmo deu ao povo (aqui). Tais leis vão, na verdade, desde uma legislação a respeito de altares, passando pela escravidão, violência, propriedade, até o testemunho falso. No presente estudo farei uma síntese destes mandamentos, que são uma parte da lei que visa legislar sobre a vida civil e religiosa do povo.
Apenas um aviso a exiguidade do tempo com que se ministra uma aula de Escola Bíblica Dominical, associada a amplitude do assunto, demanda, por parte de professores que a exposição da temática seja feita de forma breve. Daí a razão deste post ser bem compacto.
 
1) Leis acerca dos altares 
Diga o seguinte aos israelitas: Vocês viram por si mesmos que do céu lhes falei: não façam ídolos de prata nem de ouro para me representarem. Façam-me um altar de terra e nele sacrifiquem-me os seus holocaustos e as suas ofertas de comunhão, as suas ovelhas e os seus bois. Onde quer que eu faça celebrar o meu nome, virei a vocês e os bençoarei. Se me fizerem um altar de pedras, não o façam com pedras lavradas, porque o uso de ferramentas o profanaria. Não subam por degraus ao meu altar, para que nele não seja exposta a sua nudez (Ex 20. 22 - 26 NVI). 
Visava resguardar o povo de ser tentado pela excessiva admiração aos elementos da natureza e com isto fazer com que os mesmos se tornassem deuses, ou de representar a Deus por meio por meio de ídolos de prata, e mesmo de ouro. De certa forma esta lei é uma ampliação dos dois primeiros mandamentos, onde se lê:
Não terás outros deuses além de mim. Não farás para ti nenhum ídolo, nenhuma imagem de qualquer coisa no céu, na terra, ou nas águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante deles nem lhes prestarás culto, porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que castigo os filhos pelos pecados de seus pais até a terceira e quarta geração daqueles que me desprezam (Ex 20. 3- 5 NVI). 
 
2) Leis acerca da escravidão
Se você comprar um escravo hebreu, ele o servirá por seis anos. Mas no sétimo ano será liberto, sem precisar pagar nada (Ex 21. 2 NVI).
Um problema grave com esta lei é a tendência de se ler a mesma com a ótica histórica moderna. Assim, quando alguns críticos, principalmente os da fé, e ateus como Sam Harris leem tais leis é a de verem tal escravidão com a mesma ótica da que fora praticada na modernidade, por meio do trafico de escravos africanos, quando na verdade são fenômenos de períodos históricos diferentes.
Nos tempos bíblicos haviam duas formas de se fazer escravos. A primeira era mediante a guerra, os derrotados eram  feitos de escravos, este é o caso da menina que servia na casa de Naamã (II Rs 5. 2). Mas também as pessoas que estivessem endividadas e sem condições de pagar dívidas poderiam se vender como escravas, conforme se pode ver no texto abaixo, mas não poderiam ser tratados com desumanidade, pelo contrário!
 Se alguém do seu povo empobrecer e se vender a algum de vocês, não o façam trabalhar como escravo. Ele deverá ser tratado como trabalhador contratado ou como residente temporário; trabalhará para quem o comprou até o ano do jubileu. Então ele e os seus filhos estarão livres, e ele poderá voltar para o seu próprio clã e para a propriedade dos seus antepassados. Pois os israelitas são meus servos, a quem tirei da terra do Egito; não poderão ser vendidos como escravos. Não dominem impiedosamente sobre eles, mas temam o seu Deus (Lv 25. 39 - 43 NVI). 
Duas coisas precisam ficar claras. Primeiro a escravidão não foi ordenada por Deus, Ele simplesmente a regulamentou, tal como ocorreu com o divórcio. O que nos faz pensar que a origem da mesma seja o sentimento de denominação presente no coração humano desde a queda e acentuado nos dias do diluvio. Segundo, a levar em conta os mandamentos que regulam a prática, percebemos que ao contrário do que ocorreu na Grécia antiga e em Roma, a escravidão não foi um modo de produção em Israel. Nas demais civilizações boa parte do trabalho era escravo, o que garantia o ócio de uma classe que se via livre para debater os assuntos pertinentes à cidade. Esta diferença precisa ser vista.
 
3) Leis a respeito da integridade física
Mas, se houver danos graves, a pena será vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé,   queimadura por queimadura, ferida por ferida, contusão por contusão (Ex 21. 23 - 25 NVI). 
Duas considerações precisam ser feita aqui. Primeiro: esta lei, ao contrário de ser um incentivo á vingança, é um fator limitador da mesma. Ela foi feita de forma a não permitir exageros, por parte de indivíduos que tenham sido ofendidos, agredidos, ou cujos familiares tenham sido vitimas de tais lesões. Segundo, a lei traz consigo o principio justo da retribuição, que por sua vez tem de ser exercido pelo Estado. Com isto o alvo aqui é a preservação da integridade física dos filhos de Israel.
Estes princípios norteiam a administração de justiça contra todo o tipo de agressão, desde a que é praticada contra pai e mãe, até o prejuízo causado por animais em seres humanos. Por exemplo, quando um boi feria um ser humano o mesmo era apedrejado até a morte, mas se testemunhas afirmassem em juízo que o animal era agressivo e com isto configurasse que o dono do mesmo fora omisso, o dono também poderia morrer, caso a vida do mesmo não fosse resgatada.
 
4) Leis a respeito da propriedade
Se alguém roubar um boi ou uma ovelha e abatê-lo ou vendê-lo, terá que restituir cinco bois pelo boi e quatro ovelhas pela ovelha. Se o ladrão que for pego arrombando for ferido e morrer, quem o feriu não será culpado de homicídio, mas se isso acontecer depois do nascer do sol, será culpado de homicídio. Um ladrão terá que restituir o que roubou, mas se não tiver nada, será vendido para pagar o roubo.
Se o que foi roubado for encontrado vivo em seu poder, seja boi, seja jumento, seja ovelha, ele deverá restituí-lo em dobro. Se alguém levar seu rebanho para pastar num campo ou numa vinha e soltá-lo de modo que venha a pastar no campo de outro homem, fará restituição com o melhor do seu campo ou da sua vinha. Se um fogo se espalhar e alcançar os espinheiros, e queimar os feixes colhidos ou o trigo plantado ou até a lavoura toda, aquele que iniciou o incêndio restituirá o prejuízo.
Se alguém entregar ao seu próximo prata ou bens para serem guardados e estes forem roubados da casa deste, o ladrão, se for encontrado, terá que restituí-los em dobro. Mas se o ladrão não for encontrado, o dono da casa terá que comparecer perante os juízes para que se determine se ele não lançou mão dos bens do outro.
Sempre que alguém se apossar de boi, jumento, ovelha, roupa ou qualquer outro bem perdido, mas alguém disser: ‘Isto me pertence’, as duas partes envolvidas levarão o caso aos juízes. Aquele a quem os juízes declararem culpado restituirá o dobro ao seu próximo.
Se alguém der ao seu próximo o seu jumento, ou boi, ou ovelha ou qualquer outro animal para ser guardado, e o animal morrer, for ferido ou for levado, sem que ninguém o veja,  a questão entre eles será resolvida prestando-se um juramento diante do Senhor de que um não lançou mão da propriedade do outro. O dono terá que aceitar isso e nenhuma restituição será exigida.
Mas se o animal tiver sido roubado do seu próximo, este terá que fazer restituição ao dono. Se tiver sido despedaçado por um animal selvagem, ele trará como prova o que restou dele; e não terá que fazer restituição. Se alguém pedir emprestado ao seu próximo um animal, e este for ferido ou morrer na ausência do dono, terá que fazer restituição. Mas se o dono estiver presente, o que tomou emprestado não terá que restituí-lo. Se o animal tiver sido alugado, o preço do aluguel cobrirá a perda (Ex 22. 1 - 15 NVI).
Aqui temos um conjunto de leis que visam proteger a propriedade. Há que se perceber que a tônica em caso de roubo, ou de quaisquer prejuízos é a da correta restituição do que foi roubado, ou nos casos em que o bem estava sob a tutela de outrem e por descuido do que estava com a responsabilidade pelo bem alheio houve prejuízo. Uma ressalva são os casos em que animais são dilacerados por outros animais, ou que os bens sob tutela foram roubados.
 
5) Leis sociais
Não maltratem nem oprimam o estrangeiro, pois vocês foram estrangeiros no Egito.
"Não prejudiquem as viúvas nem os órfãos; porque se o fizerem, e eles clamarem a mim, eu certamente atenderei ao seu clamor. Com grande ira matarei vocês à espada; suas mulheres ficarão viúvas e seus filhos, órfãos
(Ex 22. 21  - 24 NVI).
Este é um dos aspectos da lei mais repetidos pelos profetas. Em sua maioria os mesmos enfatizam que a justiça é a correta forma de adoração a Deus (veja aqui).  Para Stott, a tradição evangélica e reformada enfatizaram suficientemente bem que Deus é justificador daquele que tem a fé em Jesus, mas ainda precisa resgatar o conceito de um Deus que é justo, e como tal defende a causa dos aflitos.
Ele defende a causa dos oprimidos e dá alimento aos famintos. O Senhor liberta os presos, o Senhor dá vista aos cegos, o Senhor levanta os abatidos, o Senhor ama os justos. O Senhor protege o estrangeiro e sustém o órfão e a viúva, mas frustra o propósito dos ímpios (Sl 146. 7 – 9 NVI). 
E nós, como temos nos posicionado? 
 
6) Sobre a conduta justa
Não faça declarações falsas e não seja cúmplice do ímpio, sendo-lhe testemunha mal-intencionada.
Não acompanhe a maioria para fazer o mal. Ao testemunhar num processo, não perverta a justiça para apoiar a maioria, nem para favorecer o pobre num processo.
Se você encontrar perdido o boi ou o jumento que pertence ao seu inimigo, leve-o de volta a ele.
Se você vir o jumento de alguém que o odeia caído sob o peso de sua carga, não o abandone, procure ajudá-lo.
Não perverta o direito dos pobres em seus processos.
Não se envolva em falsas acusações nem condene à morte o inocente e o justo, porque não absolverei o culpado.
Não aceite suborno, pois o suborno cega até os que têm discernimento e prejudica a causa do justo
(Ex 23. 1 - 8 NVI). 
Não dirás falso testemunho contra o teu próximo (Ex 20. 16 ARCF). Este é o nono mandamento do decálogo. E ele aparece aqui sob a proibição de se fazer declarações falsas em juízo, principalmente quando tal consiste em uma atitude de apoio aos ímpios. A justiça nem sempre é democrática, daí que a maioria não deva ser acompanhada, caso tal seja uma perversão do direito.
Uma questão que precisa ficar clara é que o procedimento justo elimina toda e qualquer forma de retaliação pessoal. Note, que a mesma lei que afirma: vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé,   queimadura por queimadura, ferida por ferida, contusão por contusão (Ex 21. 23 - 25 NVI), também traz consigo uma proibição à retaliação pessoal, ao estipular que se socorra o boi do próprio inimigo
Em nossa cultura, a justiça é representada por meio da deusa grega Têmis, sendo representada com os olhos vendados e com uma balança nas mãos. Tal representação se dá em razão de uma compreensão de justiça que se eleva acima das paixões (aqui). No meio hebreu, o próprio Deus vindicou para si esta imparcialidade ao afirmar: Pois o Senhor, o seu Deus, é o Deus dos deuses e o Soberano dos soberanos, o grande Deus, poderoso e temível, que não age com parcialidade nem aceita suborno (Dt 10. 17 ARCF). Assim, Deus não julga nem em favor do pobre, pelo simples fato de ser pobre, e muito menos pelo poderoso, por ser poderoso, mas pela causa da justiça. E assim, pede do seu povo: Não farás injustiça no juízo; não respeitarás o pobre, nem honrarás o poderoso; com justiça julgarás o teu próximo (Lv 19. 15 ARCF).
O proposito divino em formular tais leis não se esgota na esfera religiosa, mas com isto de quer dizer que a santidade do povo deve abranger a vida civil e social do mesmo. Tal compreensão falta em nossos dias dado ao conceito cada vez mais abstrato e escapista da espiritualidade evangélica brasileira e principalmente a pentecostal. Mas a Bíblia nos convida ver um Deus que faz justiça ao aflito e ao engajamento na construção de uma sociedade mais justa.
 
Em Cristo, Pr Marcelo Medeiros

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