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segunda-feira, 1 de junho de 2020

Semente de Mostarda Versus Semente MacMundo



Prometi no Facebook Fazer uma resenha crítica deste livro. O título dele em Português pode induzir a erro. Explicarei. O Lado Oculto da Globalização (como defender-se dos valores da nova ordem mundial), possui no atual contexto uma ideia de teoria conspiracionista, na qual o cristão vê-se como vítima de um processo conspiratório para a destruição de valores da sociedade Ocidental (dita cristã), e implantação da nova ordem mundial por meio de pautas progressistas. Nada mais falso do que isto. 

Na conjuntura atual o conservadorismo, o obscurantismo e o espírito anticiência (que não são sinônimos e nem equivalentes entre si) tem ganhado espaço entre nós, por conta de uma visão que pode ser chamada de fundamentalista onde cada movimento da sociedade tem sido interpretado como uma ameaça à fé cristã. Assim, ganham espaço pensadores que fazem campanhas contra o feminismo, por exemplo. O perigo que tal forma de pensar representa, é que no afã de criticar o feminismo pode-se perder questões mais vitais à fé e ao evangelho como a violência contra a mulher e o racismo

Na perspectiva de Tom Sine a nova Ordem mundial não é a adoção de pautas progressivas. Ela sequer á nova, é tão antiga quanto. Nova Ordem Mundial é uma ordem que se opõe ao Evangelho. Este é representado pela semente de mostarda, ou pelo fermento colocado na farinha. Coisas pequenas que aos poucos vão influenciando e alterando o ambiente. No caso da semente de mostarda a vegetação, no do fermento uma massa. 

Já a semente MacMundo é marcada pela lógica de sucesso, ganho exaustivo e o conforto que o dinheiro e o consumo possam possivelmente garantir. É a lógica de Mamon, que é considerado o Deus do dinheiro para os povos do oriente. Na perspectiva do autor toda a estrutura deste mundo está voltada para a lógica de consumo. Daí que tanto a igreja, as instituições, a política e a própria educação tornaram-se presas desta lógica de consumo. 

Aqui é importante uma observação. A lógica do Evangelho representado pela semente de mostarda, pequena, mas cujo crescimento gradual revela uma árvore grande diante da qual as aves do céu se aninham. Mas o crescimento é lento e gradativo. Já a semente MacMundo adéqua-se à nossa realidade atual, marcada pela velocidade, pela ausência de radicalidade e profundidade. 

No tocante à Igreja, esta é descrita pelo Novo Testamento como sendo uma comunidade (palavra possivelmente composta por aglutinação dos termos comum e unidade) indicando com isto a verdade bíblica de que Igreja não é templo, placa, CNPJ, instituição, antes é ajuntamento de pessoas, que a despeito da individualidade se tornam unas em função daquilo que há em comum. Uma só fé, um batismo, um só Senhor, uma esperança, um só Espírito (Ef 4. 1 - 6). 

Esta também é uma comunidade de serviço, que no ato de servir., de ser sal e luz termina por influenciar a sociedade. É a comunidade em que as pessoas colocam seus dons e serviços em favor da causa do Reino de Deus. Viver no mundo é um viver missional. Tanto o trabalho e a formação secular quanto a teológica são parte do ser sal e luz neste mundo. 

Mas a lógica de consumo perverte o conceito e a ação da Igreja no mundo. Sob a lógica da semente MacMundo a igreja deixa de ser um ajuntamento de pessoas cuja unidade dá-se em razão daquilo que possuem em comum, e onde os bens materiais são parte daquilo que possuem em comum (o que garante a unidade), e passa a ser um prédio, uma instituição, uma franquia cuja finalidade é garantir aos consumidores da religião o conforto necessário quando as estruturas do MacMundo falham. 

A semente MacMundo, a despeito da promessa de realização de uma vida centrada na fruição de bens (na verdade aquisição, sequer consumidores somos mais), falha justamente porque a a verdade inexorável do Evangelho afirma que a vida do homem não consiste na abundância dos bens que ele possui. Nossa geração serve ao dinheiro porque acredita que ele possa trazer meio para consumir e assim realizar os sonhos de consumo. Mas no afã de servir ao dinheiro pode-se perder a vida. 

A fala de Tom Sine ganha eco quando se considera a emergência da lógica de consumo na política, mais do que isto a sobreposição da Economia sobre a vida humana, sobre a Ética. (Esta sobreposição pode ser vista no atual cenário). Diante das medidas de isolamento recomendadas pela OMS e adotadas pelos governadores e prefeitos a razão sucumbiu diante da possibilidade de perda salarial e de postos de emprego. Perder a vida tornou-se irrelevante. Foi totalmente esquecido que sem vida não há economia. 

Beyong Chul-Han, filósofo germano-coreano afirma em Sociedade do Cansaço que a finaceirização do mundo moderno contaminou a Política enquanto arte liberal (fazer realizado livre de coerções externas). O resultado é uma lógica opressora em que o opressor não está mais do lado de fora do sujeito, antes é o próprio sujeito que se torna opressor de si mesmo. E ele o faz impondo a si uma rotina que o leva à exaustão. 

Voltando à questão política, esta deixa de ser a arte de bem governar que é exercida por meio da discussão e passa a ser a garantia de uma economia que dê liberdade ao homem para empreender e consumir. Não se fala em liberdade para produção artística e intelectual, mas naquela que permite a fruição de bens. A vida em si não importa. 

Na educação o assunto não é menos animador. Diante do toda crise se pensa a educação e por uma razão bem simples. É a educação que garante a afirmação e o desenvolvimento de indivíduos que garantirão a permanência, o desenvolvimento e as  mudanças nesta mesma sociedade. Daí que diante das crises propostas educacionais sejam aventadas. Foi assim com a crise da modernidade que retirou o monopólio da educação das mãos da Igreja católica, e foi assim na década de trita do século passado, em que várias propostas educacionais foram aventadas. Cipriano Carlos Luckesi e Tomaz Tadeu Silva falam destas propostas em seus respectivos clássicos. 

Uma crítica  do autor no campo da educação dá-se por conta da ausência de reflexão, por parte dos educadores no tocante aos métodos que empregam, ao ponto de sequer saberem justificar suas ações pedagógicas. Aqui cabe ressaltar que ele está falando em contexto americano. No brasileiro, cabe o entendimento de que a educação até o inicio do século passado era privilégio das elites. Daí que a criação das Universidades preceda à qualquer reflexão sobre a educação básica e média (acessível exclusivamente aos religiosos e sucateada após a expulsão dos jesuítas). 

Sob este aspecto o  intelectualismo passa a ser visto como símbolo do status quo, e de esnobismo. ao lado desta percepção antiliberal cresce a ideia de que é a educação a garantidora de ascensão social. É neste hiato que crescem as buscas por um diploma de nível superior, e as instituições privadas que além de oferecer tais diplomas ainda o fazem sob a promessa de que de posse de tais diplomas os alunos irão se inserir melhor no mercado de trabalho. 

Não tenho nada contra as instituições de ensino privado. Vi pessoalmente gente de extrema qualidade nestas instituições. A minha em particular tinha uma proposta interessante: formar professores que refletiam suas respectivas práticas. Mas ao lado deste discurso havia um de inserção  no mercado de trabalho. Até os textos trabalhados em sala de aula eram aqueles que figuravam em concursos. Qual o problema disto? Os seis períodos de Metodologia cientifica não garantiam a formação de profissionais reflexivos. 

Acredito que por trás de todo este ódio à educação pública, ao Paulo Freire (cujas ideias jamais foram executadas aqui) é fruto de  um ressentimento ( que não pode ser confundido com o uso que Nietzsche faz deste termo) face à não realização desta promessa MacMundo. Emm redes sociais tive de lidar com questionamentos do tipo: há cem anos não temos gênios na literatura. Um questionamento perigoso se considerarmos que Machado de Assis, nosso maior gênio era autodidata (será que por conta de sua condição étnica?) .

C. S. Lewis fala deste assunto em um artigo intitulado lírios que apodrecem, do qual falarei em outro post aqui, mas cuja ideia central posso adiantar. Tal como no caso inglês, a educação fracassa em desenvolver nas pessoas algum tipo de gosto, seja literário, seja científico, ou artístico em geral. Sem este processo as pessoas terminam por não descobrir suas respectivas vocações e abraçam a lógica MacMundo (terminam fazendo trabalhos insuportáveis pelo puro e simples dinheiro). Isto é semente MacMundo. 

A proposta de Tom Sine é a de uma vida simples, de ruptura com a lógica de consumo que alimenta o MacMundo (oposto a Deus e aos valores do Evangelho).  É somente com tal ruptura que a Igreja poderá voltar a viver sua dimensão ministerial e missional no mundo. Recentemente discuti com um crente nestas comunidades do Facebook,  que afirmava ser o feminismo mm mal a ser combatido. Há alguns que pensam da mesma forma em relação ao homossexualismo e até ao marxismo. Estes citam textos do Evangelho (claro que fora de contexto). 

Vi recentemente um pastor que não sei se pela pressão da massa que o chama de marxista, comunista, postar um livro de um autor polonês que critica o marxismo. Eu também critico e leio autores em apologética que fazem tais críticas, mas percebo algo que não vejo na maioria dos ministros eclesiásticos. Marx tem seu lugar como pensador não pelas razões que os revisionistas lhe atribuem. Para Marx o Capital era o grande deus do período em que ele estava vivendo. Em outras palavras: contrariando o que foi dito por Nietzsche, Deus não morreu, virou dinheiro (frase de Giorgio Agambem). 

Marx presta um inegável serviço ao Evangelho, ao denunciar na linguagem de sua época a semente MacMundo como responsável pela subversão da própria Religião, que deixa de ser aquilo que nos toca de forma incondicional, para ser uma ferramenta à mais ao serviço da lógica de consumo. Mas qual é a saída para tudo isto? Com certeza não é a revolução proposta por Marx que toma do burguês os meios de produção (pensamento do autor do livro). A revolução proposta por Marx não se aplica mais a uma sociedade pautada no capitalismo financeiro. 

O que Tom Sine propõe, à semelhança de Stott, é uma forma de contra cultura, onde a Igreja ao invés de prestadora de serviços fast foods passa a  ser uma comunidade contracultural baseada nos moldes evangélicos. Estes se  concretizem  no estilo de  vida simples,, onde no  lugar de angariar recursos para o consumo, cada cristão dispõem de seus recursos para a correção das injustiças sociais, cumprindo o proposto na parábola do administrador infiel. 

A semente de mostarda traz em si a negação do discipulado e  da educação em série.  como se seres humanos pudessem ser formados em série, nos moldes industriais. A semente do grão de mostarda aponta, antes que houvesse uma formulação do conceito de individualidade, o Evangelho já tratava daquilo que Caio Fábio chama de individuação, que nada mais, nada menos é do que o indivíduo formado para agir. 

Em Cristo, Marcelo Medeiros. 

Um comentário:

  1. Bomo texto. Identifiquei-me nele por ter uma grande dose de conservadorismo clássico.

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