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sábado, 7 de fevereiro de 2015

Santificarás o Sábado



Dos mandamentos do decálogo, nove possuem caráter normativo, e apenas um funciona como uma forma de memorial. Este é o mandamento referente ao sábado. As palavras de Deus para Moisés foram: lembra-te do dia de sábado para o santificar (Ex 20. 8 ARA). O sábado deveria de ser posto à parte. Mais ainda, ele marcaria o relacionamento de Deus com Israel. Mesmo assim, não ha indícios de que Adão, Noé, e os demais patriarcas tenham guardado o sábado. Todavia, este mandamentos tem se tornado o cavalo de batalha na relação entre crentes históricos e grupos sectários. Daí a necessidade de reflexão sobre este mandamento. 

O SÁBADO NA CRIAÇÃO
E, havendo Deus terminado no dia sétimo da sua obra, que fizera, descansou neste dia de toda a sua obra que havia feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou. Porque nele descansou de toda obra que como criador fizera (Gn 2. 2, 3 ARA). 
O texto em língua vernácula afirma que Deus descansou, e quando descansou, ao terminar toda a sua obra que havia feito. Descansou porque se sentiu cansado? De forma alguma! Aqui se pode recorrer à fala de Isaías, que diz: não sabes, não ouvistes, que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos confins da terra, nem se cansa, nem se fadiga? Não se pode esquadrinhar o seu entendimento (Is 40. 28 ARA). 

A expressão nayekal [וַיְכַ֤ל], é flexão do verbo kalah, cujo sentido é o de completar, preparar, consumar, fazer cessar. Ao concluir a sua obra Deus descansou, mas não descansou em um mundo caído, manchado pelo pecado, mas em um cosmos ainda permeado pela ordem. Foi por este motivo que Santo Agostinho (citado com extrema propriedade pelo autor da lição), viu aqui um prelúdio do descanso final, reservado aos santos na regeneração de todas as coisas. 
Ora o sétimo dia não tem crepúsculo. Não possui ocaso, porque Vós o santificastes para  permanecer eternamente. Aquele descanso com que repousastes no sétimo dia após tantas obras excelentes e sumamente boas - as quais realizastes sem fadiga - significa-nos, pela palavra de vossa Escritura, que também nós depois de nossos trabalhos, que são bons, porque no-los concedeste, descansaremos em Vós, no sábado da vida eterna (Confissões, Livro XIII, 36. 51). 
Partindo da omissão, dos autores sagrados, da frase houve tarde e manhã, e [...]  Agostinho conjectura que o sábado da primeira criação era um símbolo do descanso final. Partindo das elucubrações deste pensador, entendo aqui que o sábado inicial tinha este caráter também, e que cessou quando o homem pecou e se alienou de Deus. 

Para Agostinho, o Deus que age e opera em nós, finalmente descansará em nós. Para este gigante da era patrística tanto o agir, quanto o descansar provinham de Deus. Assim, o descanso somente é pleno na medida em que o homem se relaciona com Deus de forma íntima e confiante, e na eternidade este relacionamento jamais cessará. 

O SÁBADO E ISRAEL NO DESERTO

Não há registro bíblico de que os patriarcas tenham guardado o sábado. Ele somente irá aparecer na vida dos israelitas em decorrência da provisão do maná no deserto. Por todos os dias da semana o povo colhia do maná somente o que lhe dava para a subsistência, ao passo que no sábado eram colhidas duas porções, a do dia, e do dia seguinte. Depois do maná, Deus o institucionaliza no Sinai. Assim, 
Ao sexto dia, colheram pão em dobro, dois gômeres para cada um; e os principais da congregação vieram e contaram a Moisés. Respondeu-lhes ele: isto é o que disse o Senhor: amanhã é repouso, o santo sábado do Senhor; o que quiserdes cozer no forno cozei-o, e o que quiserdes cozer em água, cozei-o em água, tudo o que sobrar separai para a manhã seguinte. E guardaram-no até a manhã seguinte, como Moisés ordenara; e não cheirou mal, nem deu bichos. Então disse Moisés, comei-o hoje, porquanto o sábado é do Senhor; hoje não o achareis no campo. Seis dias o colhereis, mas o sétimo é o sábado, nele não haverá (Ex 16. 22 - 26 ARA). 
Neste contexto o descanso do sábado representa a confiança na providência divina, que restringe o homem do trabalho excessivo visando acúmulo de bens (neste caso representado pelo maná, que nos demais dias não durava até o dia seguinte). Aqui se desenham as primeiras lições do Evangelho de Cristo. A providência é diária, o pão, é de cada dia, o que se acumula apodrece. A única exceção é o sábado. Na véspera deste a medida é em dobro, indicando com isto que a única justificativa para o acúmulo é a fruição sadia, conforme delineado no livro de Eclesiastes [aqui]. 

Conforme subtendido na fala de Santo Agostinho, o Deus que trabalha em nós (emprego o pronome na primeira pessoa, visto que os autores citados assim o fazem), no qual nos movemos e existimos, é o mesmo do qual Isaías fala. Fato é que desde a antiguidade não se ouviu, nem com os ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu, Deus além de ti, que trabalha para aquele que nele espera (Is 64. 4 ARA). O mesmo Deus que ordenou o trabalho para o homem, o convida ao descanso reparador. A esta altura convém ver de perto o sábado e a lei. 

O SÁBADO E A LEI

Na lei, especificamente no decálogo, o sábado aparece enquanto instituição divina. Eis as palavras que Deus disse á Moisés do meio da tempestade:
Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é sábado do Senhor, teu Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas de dentro, porque em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou (Ex 20. 8 - 11 ARA). 
Além do descanso auto imposto, o mandamento do sábado é estendido a todas as esferas de relacionamento do judeu. Para ver mais a respeito do sentido do trabalho na Bíblia, veja este artigo aqui. Perceba que a ênfase do mandamento não está na ociosidade, mas no ócio reparador, que permite ao homem continuar sua atividade criadora por meio do trabalho, esta é a primeira questão. a segunda é que o sentido de trabalho equivale a sofrimento, lembrando da punição dada ao homem no Édem (Gn 3. 19 ss). Não se irrite caro leitor, pois a lei diz que o sábado é sinal de uma aliança entre Iahweh e seu povo, leia:
Tú pois falarás aos filhos de Israel e lhes dirás: : certamente guardareis os meus sábados; pois, é sinal entre mim e vós nas vossas gerações, para que saibais que EU SOU o senhor que vos santifica. Portanto guardarei o sábado, porque é santo para vós outros; aquele que o profanar morrerá, pois qualquer que fizer nele alguma obra será eliminado do meio do seu povo. Seis dias se trabalhará, porém o sétimo dia, é o sábado de repouso solene, santo ao Senhor, qualquer que no dia de sábado fizer alguma obra morrerá. Pelo que os filhos de Israel guardarão o sábado, celebrando-o por aliança perpétua  nas suas gerações. Entre mim e os filhos de Israel , é sinal é sinal para sempre, porque em seis dias fez o Senhor os céus e a terra, e, no sétimo dia descansou, e tomou alento (Ex 31. 13 - 17 ARA). 
Neste contexto o sábado é o corolário da aliança de Deus com o seu povo na antiga dispensação, é estatuto perpétuo entre Deus e Israel, exclusivamente, não sendo imposto aos gentios sequer pela Igreja de Jerusalém, ou por Paulo em qualquer de suas cartas. Sendo mencionado nos Evangelhos em razão da controvérsia entre Jesus e os fariseus. 

O SÁBADO NO CONTEXTO DO EVANGELHO

A guarda do sábado conforme visto até aqui é o corolário de uma vida pautada na obediência aos mandamentos e na confiança na provisão divina. O problema é que a lei que foi dada para a graça foi transformada em mérito pelo homem, e os fariseus são os principais responsáveis por este mal entendido. Na verdade em razão da cobiça humana, os mandamentos se tornaram inviáveis, inviabilizando com isto o descanso sabático. 

Mais do que isto, na controvérsia entre Jesus e os fariseus, o sábado aparece como empecilho para a realização da obra do reino de Deus. O caso de uma mulher que andava encurvada pela ação de um demônio é emblemático, o mesmo se pode dizer de um homem que foi á casa de um fariseu, para lá ser curado por Jesus (Lc 13. 10 - 17; 14. 1 - 5). A lição que fica é que se a lei é distorcida, ou enfraquecida pela carne, o sábado se anula. 

Em Cristo, Marcelo Medeiros. 

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