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terça-feira, 30 de março de 2021

Nossa Educação foi Aparelhada pela "Esquerda"?


O leitor dos meus posts e do meu blog sabe que em regra, não uso em meus textos palavras como as escritas acima. Mas precisei deste meme para iniciar uma discussão a respeito de uma temática e de uma narrativa que tem ganho extrema popularidade nos dias atuais. Assumo o risco de usar este meme sabedor de que aqueles que não nutrem a minima simpatia pelas minhas ideias irão ignorar este aspecto do meu texto. Mas paciência. 

Eu tenho claras lembranças das matérias de Educação Moral e Cívica, da antiga quinta série do ensino fundamental na Escola municipal Soares Pereira. Foi nesta instituição que iniciei meus estudos e concluí o Ensino Fundamental, na época ainda chamado de Primeiro Grau. Não me considero alguém de memória privilegiada por conta de lembranças tão claras, das matérias e dos professores e professoras que lá tive. 

Na verdade, entendo que se a escola exerceu tamanha influência sobre a minha vida, eu devo isto muito mais à minha falecida avó. Esta me dizia sempre: "estude para ser alguém". Devo também a um grupo de pessoas que me deu a chance de "estudar" música e poder me profissionalizar, o incentivo que tive para ir além do ensino fundamental, passando pelo médio e superior, ainda que nenhum destes seja na área da música. 

Em outras palavras, aprendi como uma senhora iletrada que não bastava frequentar a escola, era necessário aprender e valorizar aquilo que havia aprendido. Anos mais tarde, ao fazer a graduação de Pedagogia, e uma reminiscência de minha trajetória educacional, as palavras de minha avó são fundamentais para a compreensão a respeito da educação. 

Me formei em Pedagogia, com habilitação em ensino nas séries iniciais, coordenação pedagógica e orientação educacional em dois mil e seis. Colei grau em dois mil e oito. Eram o áureos tempos do governo do PT. Adjetivo o governo desta forma por coincidir com a época em que Obama disse que Lula era o cara. Explico nas linhas abaixo. 

Enquanto o mundo tentava resolver uma crise em decorrência de uma péssima operação feitas por bancos, o Brasil surfava na onda da venda de commodities para a China de modo que aquilo que foi um tsunami no mundo inteiro foi uma marolinha aqui. Não tendo crise ninguém contesta a política e a Educação. 

Aqui convém observar que as grandes propostas educacionais do século vinte surgiram, no contexto da crise do pós guerra e da queda da bolsa de valores em mil novecentos e vinte e nove. Mas também foi nesse período que o mundo testemunhou a ascensão do nazismo e do fascismo. E o atual momento não deixa de ser tão confuso quanto.

Uma olhada no cenário político atual revela uma quadro interessante de distorções e incompreensões na leitura de autores clássicos, de teorias políticas, da ascensão do neo nazismo, do recrudescimento do preconceito racial em países cuja marca histórica é a democracia de demais valores liberais. A quebra, depredação de monumentos históricos cuja leitura e interpretação deveriam de ser re-significados à luz do contexto e dos valores atuais. 

Todos estes elementos são (conforme afirmado acima), sintomas de uma crise que abrange desde a área econômica, passando pela política, epistemológica, moral, cognitivo noética, social. Há crises em todas as esferas da vida, de modo a produzir crescente incerteza. Mas é fato que antes da crise de dois mil e oito pouco se sentia isto. 

Antes deste período somente um autor ousava dizer que a nossa educação tinha como principal problema o aparelhamento das disciplinas por parte da esquerda, e do marxismo cultural. Mas há vinte anos atrás ninguém dava muita confiança para este autor. Tanto que cheguei na graduação com leituras filosóficas, inclusive os textos do aludido. Mas absolutamente nenhum professor o conhecia no ambiente acadêmico. 

Foi quando a crise finalmente aportou por estas terras que este autor, o Olavo de Carvalho ganhou visibilidade por aqui. Mais do que isto, gente que nunca havia se interessado pelos seus livros de Filosofia, começou a ler seus antigos artigos, agora publicados em títulos tais como: "tudo o que você precisa saber para não ser um idiota", "como enlouquecer o mundo em dez dias", "o imbecil coletivo", e coisas do tipo. 

Este autor pavimentou com suas teorias de conspiração a estrada para a Escatologia do Terror, que penetrou nas Igrejas Evangélicas por meio de estudos a respeito da Nova Era, recheados de teorias e mais teorias da conspiração, que jamais tiveram seu cumprimento efetivo, mas que meus confrades infelizmente levaram à sério. 

Foi dentro do meu evangélico que conheci os escritos deste. Graças à Deus foi também neste meio que iniciei meus estudos na Teologia e em consequência dos mesmos em Filosofia. Mas é fato que pela suposta ligação com o Cristianismo católico, Olavo de Carvalho goza de aceitação entre os evangélicos. Na disputa pela posição vem ninguém mais do que Luíz Felipe Pondé, que em razão de suas posições conservadoras seduz muitos evangélicos pelo mundo afora. 

Este filósofo tem um vídeo onde anuncia um curso de interpretação bíblica. Na dúvida procure pelo título Os Dez Mandamentos Mais Um, curiosamente lançado na esteira do sucesso da novela Os Dez mandamentos da rede Record. A Hermenêutica ali decorre de uma síntese entre Filosofia e perspectiva judaica dos textos. Mas que independentemente do processo de ruptura com a interpretação cristã, cativa e tem cativado muitos cristãos.

Pondé sempre foi um intelectual, embora em muitos textos publicados ele demonstre seu descontentamento com o meio acadêmico e atribua o mesmo à forte presença de Marx, quando o conheci e procurei me inteirar a respeito do mesmo e de suas ideias me deparei com um dos seus vídeos em que num café filosófico ele debatia com ninguém mais, ninguém menos do que a filósofa Márcia Tiburi. 

Hoje percebo que parte do fascínio exercido por Pondé, Olavo de Carvalho e cia deve-se à ausência dos acadêmicos na esfera pública, e a uma simplificação que aparentemente torna a Filosofia mais atraente e acessível, quando na verdade nem um nem outro age de fato como filósofo na esfera pública. Espantado com a afirmação? Pois é. Eles são na verdade propagandistas, marqueteiros do capital financeiro.

A Filosofia não é algo que atraia de imediato as pessoas. Nunca entendi, ao ler as falas de Norman L. Geisler e do próprio Cortella ao descreverem a Filosofia como algo inútil. Foi necessário ler Byung Chul-Han para entender que a Filosofia, enquanto arte liberal, só pode ser fruída por pessoas livres de coerções externas. 

Em outras palavras é o ócio e a ausência de preocupações com questões de subsistência que garantem a fruição, o espanto. A própria Educação se fazia a partir do Ócio, e este link aqui é bem claro a este respeito. Ócio aqui é o tempo que uma pessoa dispõe para livremente trabalhar seu desenvolvimento. Daí Bertrand Russel ter feito o seu famoso Elogio do Ócio. Um povo preocupado com sua subsistência pouco dispõe em termos de tempo para o desenvolvimento particular e pessoal. 

Mas a propaganda sempre terá o seu apelo às emoções, que por sua vez sempre se sobrepõem às faculdades intelectivas. Daí que tanto o conservador quanto o autodidata aqui mencionados recorram às técnicas de propaganda e marketing para a divulgação de suas ideias. Com a crise econômica de dois mil e doze o caminho para a penetração das idéias de ambos estava pavimentada. 

Foi a partir de então que gente que nada tinha a ver com a Escola, e com a Educação e muito menos possuía formação acadêmica para tal passou a aventar as ideias de Olavo de Carvalho. Foi neste esteio que ganharam força as idéias de que a culpa da educação escolar estar como estava era por conta da adoção da Pedagogia de Paulo Freire. Uma Pedagogia jamais aplicada aqui nestas terras. 

O pior, gente que jamais leu as ideias deste autor, começou a reproduzir a fala acima. Nesta esteira que vem as falas da imagem usada neste post. Nesta afirma-se literalmente que a educação no Brasil começou a dar errado quando as matérias de Educação Moral e Cívica e de Organização Social e Política do Brasil, foram substituídas por Filosofia e Sociologia. Aqui é possível a verificação de uma inconsistência. 

De fato a disciplina de Moral e Cívica foi instituída durante do governo militar em doze de Setembro de mil novecentos e sessenta e nove, com o intuito, de produzir nos estudantes os seguintes hábitos: "preservação da espiritualidade", "projeção dos valores espirituais e éticos da nacionalidade", "o culto à pátria", e culto e obediência à lei". Aqui cabe uma análise. 

É plenamente possível que um leitor cristão ao ler tais palavras se identifique com os ideais que justificam a criação de tal disciplina. Eu mesmo sou favorável a manutenção da mesma (lógico que adaptada aos ideais democráticos sob os quais foi promulgada a constituição de mil novecentos e oitenta e oito). 

Masa  espiritualidade da que se fala aqui nada tem a ver com a religião cristã. A espiritualidade aqui é a positivista. Esta possui um culto próprio e até mesmo um catecismo. Lógico que nada impede que se faça aqui uma síntese, mas a verdade é que o Positivismo com seu culto à ciência (tudo o que os "apologetas" [atenção às aspas] da atualidade mais abominam), pretende ser um substituto da religião em si (ou pelo menos pretendia). É neste contexto que a expressão "o culto à pátria" tem de ser entendida. 

Um cristão deve obediência às leis? Deve! Deve ser cumpridor dos seus deveres para com o próximo, e por extensão para com a sociedade? Deve sim! Mas culto não! Não se critica a divindade que se segue, cultuar a pátria e até mesmo a lei pode produzir uma cegueira que já foi testemunhada em casos como o da ascensão do nazismo e do fascismo. 

A disciplina Organização Social e Política do Brasil poderia ter permanecido, mas tal como a de Moral e Cívica teria de ser adaptada às novas conjunturas sociais e políticas. Acredito ser interessante as pessoas terem conhecimento de Lei e pela especificidade da disciplina, do artigo trinta e sete ao quarenta e um de nossa constituição. 

Quando esta foi promulgada, o então constituinte afirmou ser a mesma uma constituição cidadã. E fato é que uma leitura ainda que superficial permite a compreensão de que o esteio da mesma é o ideal social democrático. O artigo terceiro é de fundamental importância para o exercício da cidadania, luta por mais direitos e pelos direitos do outro. 

Aprendi com alguns advogados com os quais convivo que ninguém pode alegar em sua defesa em juízo o desconhecimento da lei. Entendo esta proposição doutrinária, mas como educador percebo uma certa inviabilidade em cumprir com aquilo que não se conhece. Isto posto, resumo aqui o seguinte: a lei não tem de ser cultuada (não no sentido de ser adorada), mas tem de ser solenemente respeitada, quanto mais conhecida pelo cidadão comum, maior respeito este nutrirá por ela. 

É possível que leis fossem desnecessárias se os seres humanos seguissem o bom senso. Esta é uma hipótese aventada na filosofia sim. Mas desde sempre se soube na filosofia que as leis são necessárias na regulação do convívio social. É exclusivamente sob este prisma que vejo a importância nas matérias mencionadas acima. 

O que não é falado por gente que cria memes como o da imagem acima e muito menos por Olavo e Pondé é que cabe à, Filosofia e à Sociologia a discussão a respeito de uma moral que viabilize o convívio em sociedade. E aqui gostaria de mais uma vez apelar à memória de minas aulas em Educação Moral e Cívica, com a professora Célia Regina no Soares Pereira. 

Na minha primeira aula de Educação Moral e Cívica a matéria era a noção de vício e de virtude. Me marcou muito pela polêmica que causou na turma. O conceito que tínhamos até ali de vícios erma ligados aos hábitos de beber e fumar e a professora penou para explicar que não era daquele tipo de vício que ela estava tratando. 

Vício aqui tinha, ou tem o significado de  qualquer costume condenável, ou prejudicial, que inviabiliza a convivência social. Esta noção é uma noção filosófica, que também aparece na sociologia de Emile Durkheim. Em outras palavras a disciplina não foi extinta com a finalidade de promover  aquelas que possibilitem o aparelhamento da esquerda nas instituições de ensino. 

Mas esta é uma conversa para qual poucos estão preparados na atualidade. O momento de crise ainda funciona como canalizador de ressentimentos populares contra algumas ideias e literaturas. Isto se soma ao fato de que boa parte das pessoas para quem se pergunta a respeito do conteúdo de Educação Moral e Cívica ignora o que foi ensinado, e é incapaz de associar o conteúdo com a Filosofia Moral e política. E nem quer fazer o exercício. 

Este é o ponto do presente artigo em que se faz necessário considerar as reais causas de nossa educação estar em tamanha crise. Não é a reinclusão de Educação Moral e Cívica e de Organização Social e Política do Brasil que responderão pelo fracasso evidenciado nas últimas provas do exame do PISA. Uma amiga minha me perguntou pelo que aconteceu com nossas escolas, ao que responde que a sociedade mudou e com ela os alunos também. 

O crescimento da educação no mundo acompanhou o crescimento da industrialização. Foi esta que impulsionou a chamada educação universal pública. No Brasil isto também é realidade agravada pelo fato de que para o brasileiro a educação não é um valor em si, mas um meio para a ascensão social. E como isto impacta a educação? 

Do momento em que as pessoas percebem que para crescer economicamente, podem prescindir da educação ela simplesmente é desacreditada e deixa de fazer sentido para as pessoas que assentam nos bancos escolares. O empregado da fábrica precisava de uma educação mínima para poder operar com a máquina e assim ter seu lugar garantido no mercado de trabalho. 

Trabalho era a garantia para uma vida que desse acesso aos bens de consumo. Era esta e dinâmica que impulsionava a educação. Na mesma escola em que estudei Educação Moral, e tive noções de Organização Social e Política do Brasil, também Estudei técnicas Comerciais e Artes Industriais. Testemunhei muitos de meus colegas se empregarem na indústria têxtil. 

A Souza Cruz, A Brahma, A Faet eram apenas alguns dos muitos exemplos de industrias que tinham aqui no Rio de Janeiro e que empregaram muitos de meus antigos colegas de turmas do Soares Pereira, e muitos do meio evangélico. Também vi muitos procurarem escolas técnicas como a Ferreira Vianna, ou o sistema S. 

Até alguns anos atrás era certo fazer um curso técnico em alguma área e ter acesso ao mercado de trabalho. Hoje isto não é uma verdade absoluta. E aqui reside a grande questão da educação para uns ela perdeu o sentido e para muitos ela não é útil para mais nada. E uma grande verdade pedagógica é que não se educa quem não quer aprender. 

Todavia, pessoas socialmente magoadas, e que não querem ser instruídas gostam de criar seus demônios para por neles a culpa de seu fracasso. É deste tipo de sentimento ruim que surgem os mais variados preconceitos desde os raciais até os cognitivos. é neste solo que brotam as narrativas não importando se o conteúdo estudado foi ou não conforme o descrito. 

Falo como quem se formou no Ensino Médio após a reinclusão de Filosofia e Sociologia nas grades curriculares do mesmo e nunca percebeu nas apostilas de ambas as disciplinas quaisquer viés ideológicos. Pelo contrário em ambas leu toda forma de autor desde Platão (com sua defesa da monarquia), até Comte com a defesa do Positivismo, passando por Hobbes que afirmava ser o homem mau e por Rousseau que dizia o contrário. 

O mesmo processo deu-se no Ensino Superior do qual não saí até hoje. Sigo lendo autores de todo ramo do saber. Mas com a minha ressalva principalmente aos que exalam este tipo de melancolia e magoa social. Mas a cada escrito percebo um público que não quer ler e nem mesmo se instruir, mas prefere ficar com seus preconceitos, com aquilo que sente do que fazer uma revisão das suas ideias. 

O ato de educar é um ato de desconstrução das ideias e preconceitos do senso comum e reelaboração do mesmo. Sem rigor metodológico e capacidade de sistematização, as informações que são recebidas na internet se tornam em material de construção para toda forma de preconceito. É isto que tem acontecido e aqui se percebe a saída para a Escola. 

Fui educado em uma Escola que tinha sinal para a entrada, carteirinha que marcava horário de chegada, uniforme e toda a estrutura de uma fábrica. Fora o fato de a educação ser seriada, com noção de tempo para aulas de cada disciplina e assimilação dos conteúdos. Mas naquela época havia a fábrica e esta era um centro de organização da sociedade. As casas de vila próximas das antigas fábricas são um testemunho histórico.

A sociedade mudou e a Escola (que é um produto desta sociedade) tal como a sociedade não percebeu a mudança. As Pedagogias, seja de cunho tradicional, tecnicista, liberal, ou crítico não respondem por tais mudanças. Mas esta é uma analise a ser feita à parte em outro post que como este é direcionado aos que se incomodam com a situação atual e buscam respostas. 

Marcelo Medeiros. 

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